Cortina de fumaça

Cortina de fumaça

O negacionismo sempre nasce de algum motivo obscuro e se aproveita da boa-fé alheia para se espalhar como um vírus. A CPI da Covid está escancarando como funciona essa estratégia perversa em tempos de pandemia, mas ela já foi usada em outros carnavais. Um bom – quer dizer, mau – exemplo foi o da indústria tabagista, que somente nos anos 1990 admitiu que cigarro fazia mal à saúde, mesmo que já se soubesse disso há três décadas. Essa tática não tem servido para atentar somente contra a saúde pública, mas também o bem-estar do planeta: a gigante Exxon foi alertada em 1977 por seus cientistas que as emissões de CO₂ da indústria petroleira estavam ajudando a bagunçar o clima do planeta; só que além de manter a informação em segredo, juntou-se às outras companhias para desacreditar as mudanças climáticas. Hoje, não há mais como negar, a Terra não deixa.

A pinguinzada penou e quis se depenar no dia 6 de fevereiro do ano passado, quando o termômetro marcou 18,3°C, recorde de temperatura na Antártida. A marca foi reconhecida no último dia 1º pela Organização Meteorológica Mundial da ONU e registrada no norte da Península Antártica – uma das regiões do mundo que está esquentando mais rapidamente, onde a temperatura média costumava ser -10°C. No outro extremo do globo, o Canadá vem sofrendo com uma onda de calor inédita, que já matou mais de 500 pessoas. A pequena cidade de Lytton, na Columbia Britânica, ardeu sob uma temperatura de inacreditáveis 49,6°C – quentura infernal até para os padrões brasileiros – e um estudo recente da Universidade de Lanzhou, na China, alerta que a área do planeta coberta por neve e gelo está encolhendo 87.000 km² por ano, o que dá dois estados do Rio de Janeiro.

Na Lapônia, Papai Noel encarou 33,6ºC no último dia 5, a maior temperatura na região desde 1914, segundo informou o Instituto de Meteorologia da Finlândia. Sua vizinha, a ativista sueca Greta Thunberg criticou a postura dos países do G7 em seu último encontro, dizendo que seus líderes pareciam estar se divertindo “apresentando seus compromissos climáticos vazios e repetindo velhas promessas não cumpridas”. Porém, se por um lado a reunião dos maiorais frustrou algumas expectativas, ao menos reforçou o fato de que hoje há consenso quando o assunto é a influência de atividades humanas nas mudanças climáticas. É um grande passo para a Humanidade, creiam. O negacionismo acerca desse assunto foi praticamente erradicado. Entretanto, o governo brasileiro e seus aliados no Congresso andam no mesmo descompasso, rumo a um lockdown em escala global.

Cortina de fumaça é um termo que cai como uma luva para descrever o negacionismo ambiental no Brasil. O desmatamento responde por 44% das emissões de CO₂ do país e é corresponsável pela atual crise hídrica, já que as nuvens de chuva que abastecem rios e reservatórios das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste vêm da Amazônia. E, no momento, assombram a Câmara Federal projetos de lei que facilitam a concessão de florestas públicas, regulamentam invasões e grilagens, mudam as regras de demarcação de terras indígenas, as mais preservadas do país, além de liberar a mineração e a construção de hidrelétricas em seus limites. Ou seja, botam mais lenha na fogueira da devastação florestal, que já vem crescendo em alta velocidade nos últimos anos – e que tende a disparar, pois em período pré-eleitoral o lobby das empreiteiras funciona a todo gás.

Investir em infraestrutura é a ordem do dia e, pelo andar da carruagem, um prenúncio de novos desastres. Estradas mal planejadas são os principais vetores do vírus do desmatamento. Tem um exemplo saindo do forno, quentinho: o governo acaba de licitar (em 7/7), sob uma saraivada de críticas, a concessão transitória da BR-163. A rodovia liga Sinop, no Mato Grosso, a Itaituba, no Pará, e serve de rota de exportação para o agronegócio. No seu entorno há 15.000 km² de terras públicas, cuja exploração é proibida; mas, de acordo com relatórios lançados este mês por Greenpeace e Rede Xingu+, a devastação cresceu 359% em um ano. Encarar a floresta abrindo picada a faca não é para qualquer um; com estrada asfaltada, qualquer aventureiro pode lançar mão.

A crise hídrica e o fiasco chamado Belo Monte evidenciaram que hidrelétrica, além de não ser uma fonte de energia limpa, também não pode mais ser considerada renovável; mas ao que parece, construir elefantes brancos ainda é um bom negócio. Negando a realidade, a medida provisória que regulamenta a privatização da Eletrobras vai além e prevê a obrigatoriedade da contratação de 8 GW de eletricidade produzida por termelétricas a gás, futuras peças de museu. “O risco de racionamento que o Brasil vive vem como consequência de deficiências no planejamento energético e da maior crise hídrica dos últimos 90 anos, provocada por mudanças climáticas. No entanto, a resposta que o governo federal nos dá vai na contramão do problema, ampliando a geração por termelétricas fósseis, notória consumidora de água e emissora de gases de efeito estufa, e tardando em diversificar a matriz elétrica para além das hidrelétricas, cada vez mais vulneráveis a efeitos climáticos”, diz Ricardo Baitelo, coordenador de projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema).

Termelétricas são beberronas e dispendiosas: de 70% a 80% da água usada para resfriar sua estrutura evapora. Uma usina a gás natural pode consumir mil litros de água por MW/h. Para abastecer uma cidade de 156 mil habitantes, vai entornar 24 milhões de litros, caso funcione sem parar. “As térmicas a gás e que estão sendo acionadas em tempo integral nos próximos meses devem estressar ainda mais a demanda de água em regiões vulneráveis. Como é o caso do Rio Cubatão, microbacia de balanço hídrico muito crítico, segundo mapeamento da Agência Nacional de Águas, e que fornece água para a termelétrica Euzébio Rocha. Essa usina foi recontratada recentemente no leilão de energia existente, para operar pelos próximos 15 anos”, diz Baitelo. A quem interessa negar isso? O melhor remédio contra o vírus do negacionismo continua sendo a informação.

 

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Parece, mas não é

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É tênue a linha que separa o lampejo genial da ideia de jerico. Há 45 mil anos, um homo sapiens anônimo registrou seus cotidiano e imaginário numa caverna na Ilha de Sulawesi, na Indonésia. Ele foi capaz de criar uma tinta resistente ao tempo e 100% natural. Graças a isso, hoje sabemos algo sobre como viviam alguns de nossos mais remotos ancestrais. Porém, suas pinturas rupestres, as mais antigas que se tem notícia, podem desaparecer. E essa perda inestimável seria mais um estrago para pôr na conta das mudanças climáticas, segundo um estudo recém-publicado no “Scientific Reports”.

É claro que quando James Watts concebeu seu motor a vapor, em 1763, dificilmente imaginou tal relação de causa e efeito. Usar combustíveis fósseis para mover o mundo parecia um lampejo genial. A Humanidade só se deu conta de que seu modo de vida estava influindo no clima do planeta quase dois séculos depois. A invenção de Watts ajudou a encurtar distâncias e a nos aproximar; porém estar perto não resultou em estar junto. Talvez por isso foi preciso que uma pandemia nos obrigasse a enxergar o óbvio: vivemos uma emergência e estamos todos no mesmo barco. Esse sacode fez os EUA retomarem a liderança do combate às mudanças climáticas e os países mais ricos reverem suas metas de emissões.

Quem sabe este embalo tenha inspirado a Câmara dos Deputados a aprovar no último dia 13 a nova Lei de Licenciamento Ambiental. Dita assim, a notícia até parece boa – mas não é. O texto exclui a obrigatoriedade de avaliação e prevenção de impactos em obras em terras indígenas e quilombolas ainda não homologadas, contrariando a Constituição. Também abre brechas que podem levar unidades de conservação à destruição. Isso numa hora em que o mundo inteiro está de butuca no Brasil, já que o desmatamento responde por 44% de nossas emissões de CO₂. E tem mais: a nova regra cria um dispositivo que, na prática, dispensa de licenciamento ambiental a construção de barragens como as de Mariana e de Brumadinho, entre outros despautérios. Talvez os parlamentares quisessem fazer uma surpresa para a população nesses tempos tão bicudos e, por isso, não a consultaram. Que o Senado corrija esse lapso.

No inferno das boas intenções, penam as decisões mais extravagantes. Você sabia que, até os anos 1950, era comum que o pesticida DDT – o famigerado flit – fosse usado nos Estados Unidos diretamente sobre as pessoas, inclusive crianças? O pai de todos os agrotóxicos servia para matar insetos, como piolhos e mosquitos, e tinha gente que acreditava que ele era a cloroquina da poliomielite. Com o tempo, descobriu-se que o suposto santo remédio era, na verdade, um perigoso veneno e o uso do DDT foi banido no mundo todo. Afinal, a ideia de nos envenenarmos voluntariamente não parece razoável, certo? Então, o que dizer sobre o governo brasileiro, que liberou no fim de abril o uso em nossas lavouras de 34 substância proibidas em outras partes do planeta justamente por fazerem mal à saúde humana? Cá entre nós, a situação é bem parecida com a do DDT. Será que teremos um desfecho igual?

A lista de pegadinhas ambientais é extensa e curiosa. As hidrelétricas, por exemplo. Durante muito tempo se acreditou que elas produziam energia 100% limpa e renovável. Esses mitos foram derrubados por desastres como Belo Monte, um caso tão emblemático que até Bolsonaro concorda que foi “dinheiro jogado fora” (ainda que ele ache isso por motivos poucos sustentáveis). Inviável desde o começo, a usina é incapaz de fornecer a energia que foi prometida no papel. Para completar, seu reservatório emite metano, um gás do efeito estufa 28 vezes mais potente que o CO₂. A gente já alertava para isso em 2011, quando lançamos o Movimento Gota D’Água, que questionava a obra.

É a ironia das ironias: uma hidrelétrica mal-planejada que pode vir a ser aposentada por falta de água para mover suas turbinas. Uma situação parecida com a de ter um cidadão condenado por fraude ambiental indicado para ministro do meio ambiente e vê-lo ser alvo de uma operação da Polícia Federal por suspeita de envolvimento em um esquema de contrabando de madeira ilegal. São pedras cantadas, que não surpreendem a quem sabe juntar os pontos.

Na vida, você não precisa ser mais esperto que ninguém para não ser enganado. Só tem que se manter atento. Entre uma rodovia com veículos que liberam carbono e uma estrada de ferro com trens elétricos, não é difícil saber o que é melhor para o meio ambiente. Agora, se a ferrovia corta uma área verde, já são outros 500. Ou melhor, US$ 1,9 bilhão. Este é o custo estimado do impacto ambiental da Ferrogrão, que está para sair do papel, de acordo com um estudo da Climate Policy Initiative, em parceria com a PUC/RJ. Entram na conta 2.043 km² de floresta que serão desmatados e 75 milhões de toneladas de CO₂ emitidas por causa da obra. Abrir uma nova BR também não é solução. O que resolve é colocar o projeto nos trilhos, de forma a poluir o mínimo possível. Só assim para o Brasil não perder o trem da história.

 

#MeioAmbiente #Infraestrutura #MudançasClimáticas #BeloMonte #LicenciamentoAmbiental #Ferrogrão

 

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Copo meio cheio

Copo meio cheio

As mudanças climáticas estão abalando as estruturas não só do mundo ocidental, como também do oriental. Literalmente e metaforicamente. Um estudo da Academia Chinesa de Ciências e da Universidade Técnica da Dinamarca indica que o descontrole no clima vem causando alterações no eixo de rotação da Terra desde os anos 1990. A razão é a redistribuição do volume de água no planeta, causada pelo degelo dos polos – afinal, H₂O pesa. Por outro lado, depois da Cúpula do Clima convocada por Joe Biden, já é possível vislumbrar o copo meio cheio – no bom sentido, é claro. As grandes potências parecem ter acordado para o significado da expressão emergência climática, o que é ótimo. O próprio presidente americano disse que é preciso limitar em 1,5°C o aumento médio da temperatura global até 2100 – o Acordo de Paris prevê, oficialmente, 2° C. “Estão deixando a gente sonhar”, já dizia o filósofo Ronaldinho Gaúcho.

É claro que nem tudo são flores. De acordo com a mesma pesquisa, caso as emissões de gases do efeito estufa continuem em desabalada carreira, o Ártico pode descongelar nos verões de 2040 em diante. O pior é que a economia mundial pode derreter junto. O quadro é tão sério que até o presidente brasileiro foi obrigado a reconhecer que as mudanças climáticas são resultado da ação humana, um dos últimos bastiões de sua cartilha negacionista. Caso o governo não demonstre seriedade, periga o Brasil ser abandonado no século XX por seus pares. Certa vez, o ex-presidente Collor comparou os carros brasileiros a carroças. Essa hipérbole pode deixar de ser figura de retórica: se até os Estados Unidos, que têm o petróleo entranhado em sua cultura, vão apostar na eletrificação de automóveis, quem vai comprar lá fora uma peça de museu movida a suco de dinossauro?

A boa notícia é que, com a água batendo em lugares, digamos, desagradáveis, os países começaram a se mexer. Na véspera da cúpula, a União Europeia (UE) anunciou que o bloco vai zerar as emissões de CO₂ até 2050 e as reduzirá em 55 % em relação aos níveis de 1990; Vladimir Putin, presidente da Rússia, se comprometeu a atingir neutralidade em carbono até 2025; e o Japão, a diminuir em 46%, até 2030. Os americanos também deram uma cartada alta: afirmaram que vão cortar as emissões de carbono em até 52% até 2030 – na era Barack Obama, a meta era reduzir de 26 a 28% até 2025. A onda verde contagiou até o presidente brasileiro, que prometeu duplicar a verba da fiscalização ambiental no encontro de líderes – para, no dia seguinte, cortar o orçamento do Ministério do Meio Ambiente. Como diz o ditado, o que é bom dura pouco. Nesse caso, muito pouco mesmo.

O fato é que águas passadas não movem moinhos e o mundo parece mesmo estar finalmente enxergando com novos olhos a questão ambiental. Na cúpula, Joe Biden falou explicitamente nos empregos que a indústria de energia eólica poderia gerar. Os líderes das principais nações agem por duplo pragmatismo. “Ações sobre o clima não são necessárias apenas para o futuro de nossas vidas e meios de subsistência. A ação climática é o principal motor do crescimento; é a história de crescimento do século XXI”, disse o ex-economista-chefe do Banco Mundial, Nicholas Stern. Gina McCarthy, assessora nacional de clima do presidente americano, foi ainda mais sincera: “É por isso que tantas pessoas estão se interessando pela questão das mudanças climáticas. Porque agora está sendo apresentado como uma oportunidade”. É como se alguém enfim tivesse lido o cartaz há anos exibido pelos ambientalistas, que diz “Quer saber como salvar a humanidade e ainda ganhar um troco? Pergunte como!”, e pensado “Hmmm… Acho que isso me interessa”. Óbvio que interessa!

Oba-oba à parte, é hora de arregaçarmos as mangas e trabalharmos por um mundo mais sustentável. Afinal, o copo só está meio cheio. É claro que esta missão envolverá desafios. Como ajudar, por exemplo, James Owuor? Retratado pela revista Time, este queniano viu as mudanças climáticas causarem o aumento das chuvas e a subida das águas em 12 metros no Lago Baringo, na região onde vivia. Com isso, ele perdeu não só sua casa como seu emprego em um resort que existia na região e teve de fechar. O que faremos em casos como este? As nações ricas sabem que as menos favorecidas vão precisar de ajuda para fazer a transição para uma economia mais sustentável. EUA, Noruega e Reino Unido criaram um fundo para brecar o desmatamento e o anfitrião Joe Biden também anunciou na cúpula que vai dobrar as verbas para ações climáticas em países em desenvolvimento. O Brasil já falou alto quando o assunto era o meio ambiente. Em vez de pedir dinheiro em troca da proteção da Amazônia, nós, brasileiros, deveríamos liderar essa revolução verde e ajudar o mundo a superar essa emergência. Em nome de que abrir mão desse privilégio?

 

#MeioAmbiente #MudançasClimaticas #Brasil #EmissoesdeCarbono

 

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Quebre o vidro

Quebre o vidro

“Em caso de emergência, quebre o vidro”; quando chega a esse ponto é porque a água está batendo no joelho ou a casa pegou fogo. A gente vivia há anos num inusitado estado de alerta apático, como se o amanhã pudesse ser adiado eternamente, até a Covid-19 nos dar um sacode. O novo coronavírus deu um estalo na Humanidade: estamos enfrentando diversas calamidades ao mesmo tempo porque tudo é causa e consequência. Não há como dissociar a pandemia, a crise econômica, a desigualdade social, o negacionismo e o desequilíbrio climático do modelo de desenvolvimento equivocado que abraçamos. Chegou a hora de tomar medidas drásticas, ou este será um abraço de afogados definitivo.

Melhor que curar uma doença é evitá-la. E não há vacina melhor contra novas catástrofes do que atacar sua origem. Mesmo que a economia global tenha tirado o pé do acelerador por causa da Covid-19, as concentrações de metano e dióxido de carbono na atmosfera aumentaram em 2020. Foi um aumento de 2,26 partes por milhão (ppm), o maior desde 2016. Os dados são da insuspeita Agência de Administração Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (Noaa, na sigla em inglês). Por isso – e de olho no novo mercado que se descortina, evidentemente – tão logo trocaram o ocupante da Casa Branca, os americanos correram para tirar o atraso.

O presidente Joe Biden quer investir US$ 2,3 trilhões exclusivamente em infraestrutura e ao combate às mudanças climáticas, para que o país recupere o protagonismo mundial. Dessa montanha de dinheiro, US$ 174 bilhões serão investidos no setor de veículos elétricos; ou seja, os combustíveis fósseis começam a perder seu principal e mais renitente cliente. A China vinha investindo pesado em energias renováveis – e outras políticas de mitigação das mudanças climáticas – há anos. Todos podem sair ganhando nessa disputa das duas superpotências pelo pódio do desenvolvimento sustentável. Biden convocou uma Cúpula do Clima para os dias 22 e 23 próximos. Conversa séria, de gente grande.

Enquanto isso, o Brasil bate mais um recorde de desmatamento, o ministro do Meio Ambiente novamente falta com a seriedade publicamente, 58 milhões de pessoas passam fome, ainda temos um negacionista na Presidência e um a cada quatro mortos no mundo pela Covid-19 por dia é brasileiro. A boa notícia é que já tem gente quebrando o vidro de emergência; não fosse isso, já estaríamos irremediavelmente isolados ou vendidos. No último dia 13, por exemplo, seis jovens, dos movimentos Engajamundo e Fridays For Future, entraram na Justiça contra o governo, por “pedalada” ambiental.

Com o apoio de oito ex-ministros do Meio Ambiente, eles querem que o compromisso climático brasileiro para o Acordo de Paris, apresentado em dezembro, seja anulado. O governo se fez de desentendido e apresentou uma nova meta que permitirá ao país emitir, até 2030, 400 milhões de toneladas a mais do que o previsto. Entretanto, essa boiada não passou despercebida. No mesmo dia 13, o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) enviou uma carta ao governo pedindo metas ambientais mais ambiciosas. São 33 assinaturas, entre elas gigantes da indústria petrolífera como Shell, Ipiranga, Michelin e Braskem.

Além de atuar diretamente contra a pandemia, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) ganhou uma linha direta de comunicação com os Estados Unidos para temas relacionados à Amazônia. E a iniciativa de usar o martelo partiu do próprio Biden: foi o presidente americano quem solicitou a abertura deste canal. Governos vão e vem; então é melhor conversar logo com quem vem preservando a floresta há milênios, né? Como Gotas no Oceano, acreditamos que cada um pode fazer diferença se somado ao todo. Muitas vezes os movimentos sociais nascem de ações individuais – estão aí a Greta Thunberg e tantas outras para não nos deixar mentir. Quebre o vidro e encontre a sua capacidade para ajudar o mundo a sair dessa emergência.

#Amazônia #Indígenas #MeioAmbiente #MudançasClimáticas #Apib #JoeBiden #Covid19 #AcordodeParis #China #Pendemia

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Eu, a Gota

Eu, a Gota

Meu nome é D’Água, Gota D’Água. Mas pode me chamar só de Gota, que nós já temos intimidade para isso. Aqui em casa, a família é grande. Sou irmã do Pingo D’Água, aquele em que, de vez em quando, você dá um nó, e prima do Zé Gotinha, que agora voltou ao estrelato após um tempo esquecido. Como o próprio nome indica, eu sou feita inteiramente de… água. É a mesma substância que compõe 70% de você. E, por ser assim tão presente, a água até ganhou um dia só para chamar de seu: 22 de março, o Dia Mundial da Água. Mas, se a água está em todas, é bem verdade também que você anda em falta com ela. Eu poderia lhe passar um sabão por isso, mas seria chover no molhado. Por isso, prefiro lhe convidar a refletir.

Não somos apenas nós dois que somos feitos praticamente só de água. Ela cobre 2/3 da superfície do nosso planeta, chega à atmosfera na forma de vapor e está dentro de coisas tão diferentes como melancias e elefantes. Com a água, não tem tempo feio. Ela flui pelos rios, deságua no mar, viaja nas correntes oceânicas e vira gelo nos polos. Enfim, não para. E, nesse vai e vem, desempenha um papel essencial para vida na Terra. Não satisfeita, a água até dança, quando vibra em sintonia com o ritmo dos sons da natureza ou com alguma música que esteja tocando. A água é o espelho da vida, a criação mais simples – e, por isso mesmo, mais sofisticada – de toda a natureza.

Sendo assim, camarada, eu lhe pergunto: em nome de que, então, tratá-la com tanto descuido, hein? Em nome de que fazer de oceano, lagos e rios depósitos de lixo? Por que aprisioná-la em barragens ou contaminá-la com mercúrio ou agrotóxicos? É como diz aquele antigo samba: “Na hora da sede, você pensa em mim”. Se você não vive sem ela, qual o sentido de liquidá-la? Pode ser que eu esteja sendo muito árida, muito seca. Mas realmente não consigo entender. Agredi-la é como agredir a si mesmo.

Sejamos justos: não são todos da sua espécie que tratam mal a água. Dá gosto de ver o carinho dos povos indígenas, o afeto dedicado pelos quilombolas e o amor verdadeiro de ribeirinhos, pescadores, lavadeiras, surfistas, entre outros e outras pessoas. Se você é uma delas, eu me desculpo desde já. E aproveito para lhe pedir um favor: se puder, convença mais gente da importância da nossa causa. Com outros como você, nossa chance de fazer a diferença será bem maior. Não espere por mim – a Gota D’Água – para fazer este copo transbordar.

Eu não entendo quando vocês, humanos, dizem que o mar é traiçoeiro, ficam tristes em dias de chuva e têm outras reações negativas relacionadas à água. É verdade sim que ela pode destruir, mas é certo também que não tem vontade própria. Se o nível do mar está subindo, por exemplo, a causa é o crescimento das emissões de gases do efeito estufa. E, até onde eu sei, a água não anda de carro nem derruba floresta, não é? Tudo é uma questão de compreendê-la e respeitá-la. Isso é tão claro como… água. Mais cedo ou mais tarde, você compreenderá que, ok, água demais mata a planta, mas não tem jeito: todo rio corre para o mar. Cuidar da água do nosso planeta é cuidar de nós mesmos. Pode demorar, mas eu sei que vão entender. É a tal história: água mole em pedra dura…

Até lá, a água vai continuar lhe prestando os serviços que você nem imagina que ela já faz. Você sabia que mais da metade do oxigênio do planeta vem do mar? O oceano é o verdadeiro pulmão da Terra e nós o queremos bem e respirando. O impávido Bruce Lee desferiu um golpe certeiro: “Quando você põe água num copo, ela se torna o copo, quando bota na garrafa, ela vira a garrafa”. Ou seja, precisamos nos adaptar às circunstâncias. A Humanidade está num momento crucial e o seu futuro – ou não futuro – depende das escolhas que você fará agora. Não é preciso fazer tempestade em copo d’água. Eu posso ser só uma gota, mas junto de minhas iguais formo um oceano. Você também não está sozinho. Junte-se aos outros e inunde o planeta de bom senso. Tratem com amor aquela a quem vocês devem tudo.

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