O homo sapiens é o meteoro da vez

O homo sapiens é o meteoro da vez

Qual é a tua, bicho homem? A quinta – e até agora última – grande extinção em massa aconteceu há 65 milhões de anos, quando 80% de todos os animais foram pro beleléu. Rolou no finalzinho da Era Mesozoica; acredita-se que um meteoro mandou os dinossauros dessa pra melhor. No momento estamos rumos à sexta, que promete bater a segunda e mais letal, a da Era Paleozoica – entre 370 e 360 milhões de anos atrás, quando de 70% a 80% de todas as espécies existentes desapareceram. As mudanças climáticas causaram a grande extinção Paleozoica. Erupções vulcânicas incessantes que lançaram quantidades industriais de CO2 na atmosfera soam familiares? Pois o ser humano é o cataclismo da vez.

Deixamos apenas 15% das florestas e 3% dos oceanos intactos e extinguimos de uma a cinco espécies por ano. O Centro de Monitoramento e Preservação Mundial do Programa Ambiental da ONU (em parceria com as universidades Dalhousie, no Canadá, e a do Havaí) calculou em 2011 que somos 8,7 milhões de espécies de seres vivos – do protozoário que causa a malária ao homo sapiens, passando pelo panda fofinho. A poluição e a exploração desmedida do meio ambiente podem causar a extinção de metade delas até o fim do século. A Convenção da ONU sobre Diversidade Biológica (CDB COP15), que acontece até 19 de dezembro em Montreal, no Canadá, não pode deixar o bicho correr solto.

É impossível calcular quantas espécies foram extintas pelo homo sapiens desde a sua chegada, mas hoje cerca de um milhão de animais e plantas estão ameaçados de extinção. Sabemos também que em 125 mil anos a Humanidade riscou do mapa 271 mamíferos e que, nos últimos cinco séculos, foram extintos mais 80. Atualmente, 1/4 deles correm risco de ser extintos, segundo a “Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas”, da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês). Um estudo da Universidade de Tel Aviv e do Instituto Weizmann de Ciência, ambos em Israel, diz que entre 10% e 20% das espécies de aves desapareceram nos últimos 50 mil anos. Desde 1500, quando Cabral chegou ao Brasil, 311 vertebrados terrestres viraram espuma do mar.

Se a ideia era ficar sozinho na Terra, pode esquecer: caso venha a sexta grande extinção, nós vamos juntos. As condições de vida em nosso planeta são garantidas pela biodiversidade. Isso vai da produção de alimentos à proteção contra doenças e até a produção de oxigênio – como a flora marinha, que responde por 54% do ar que respiramos. Caso venha a sexta grande extinção, provavelmente estaremos entre as espécies condenadas a desaparecer. Falamos muito de mamíferos e aves e nos esquecemos de outros bichos que são fundamentais para a vida humana, como os anfíbios, que controlam a população de insetos no mundo, e os próprios insetos. O maior exemplo são os polinizadores, como as abelhas. Sem elas, morremos de fome. O bicho pode pegar.

O Brasil tem o grande privilégio e a imensa responsabilidade de ser o guardião da maior biodiversidade do globo: são mais de 116 mil espécies animais e mais de 46 mil espécies vegetais, espalhadas por seis biomas terrestres e três ecossistemas marinhos. Essa abundante variedade de vida abriga mais de 20% do total de espécies do mundo, encontradas em terra e água. Essa riqueza nos pertence, mas devemos cuidar dela, pois disso depende a sobrevivência de nossa espécie. Se o país voltou, como andaram cantando, é preciso que seja para ficar.
Não tem essa de se correr o bicho pega, se ficar o bicho come: o beco tem saída. A proposta a ser discutida CDB COP15 tem metas ambiciosas, porém perfeitamente viáveis. Entre as principais, estão a de transformar 30% dos territórios terrestres e marinhos da Terra em áreas protegidas até 2030, e um corte considerável dos subsídios estatais em atividades que prejudicam o meio ambiente.

“Estamos perdendo biodiversidade em um ritmo alarmante. Perdemos metade dos corais de águas quentes do mundo e uma área de florestas de aproximadamente um campo de futebol desaparece a cada dois segundos. Em menos de 50 anos, as populações de animais selvagens sofreram um declínio de dois terços em todo o mundo. O futuro do mundo natural está no fio da navalha. Mas a natureza é resiliente, e com um forte acordo global impulsionando ações urgentes, ela pode se recuperar”, disse Marco Lambertini, diretor geral do World Wide Fund for Nature (WWF). Ou seja, o homo sapiens ainda pode se livrar dessa fama de meteoro da vez. Então, por que esperar pra ver que bicho vai dar?

 

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No Planalto, de olho no Planeta

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Os Xakriabá são originários do Cerrado mineiro; os Guajajara brotaram da Amazônia maranhense. São lugares distantes um do outro, Célia Xakriabá e Sônia Guajajara são brasileiras de povos diferentes, mas, lembram, pertencem à mesma raça humana. E desta forma, entendem que o Brasil faz parte de algo muito maior, que nos acolhe e requer nossos cuidados: a Mãe Terra. Por isso, as duas deputadas federais indígenas recém-eleitas não esquecem que seus mandatos serão cumpridos no Planalto, mas de olho no Planeta – o que implica, de cara, a maior missão da Bancada do Cocar: ajudar a botar a “boiada” de Bolsonaro de volta para o curral.

Na ditadura, todo cidadão brasileiro sentiu na pele o que é ser tutelado pelo Estado. Para os povos originários, doeu bem mais: enquanto a Comissão Nacional da Verdade afirma que 434 civis foram assassinados pelos militares, entre os indígenas foram pelo menos 8.350 entre 1946 e 1988, sendo que antes de 1964 essas mortes foram causadas mais por omissão do Estado e, a partir daquele ano, por ação direta. Antes do golpe, a Amazônia permanecia praticamente intocada; depois, a devastação cresceu em níveis aterradores.

Embora os indígenas se mantivessem a uma distância segura da política institucional e seus vícios — à exceção da elogiada atuação do Cacique Xavante Mario Juruna na Câmara Federal, entre 1981 e 1985 — a redemocratização fertilizou o solo do movimento indígena. Ainda em 1987, a Terra Indígena Xakriabá, que fica no município de São João das Missões (MG), foi homologada. E com um preço alto pago por esses povos: os conflitos com invasores se arrastavam há anos, mas no dia 12 fevereiro de 1987, 15 grileiros invadiram a aldeia Sapé e assassinaram as lideranças Rosalino Gomes de Oliveira, Manuel Fiúza da Silva e José Pereira Santana enquanto dormiam.

Com o início dos trabalhos da Assembleia Constituinte, a geração que precedeu Sônia e Célia lutou para garantir seus direitos definitivamente. Entre os principais nomes dessa mobilização estava o Cacique Aritana Yawalapiti, levado pela Covid-19 em 5 de agosto de 2020, devido à brutalidade de mais um governo autoritário — não só em relação aos indígenas, mas a toda população brasileira, como ocorrera no século passado. A Constituição de 1988 não garantiu apenas os direitos à terra indígena e à preservação de seus costumes, mas lhes concedeu cidadania plena.

O prazo estabelecido para que todas as terras indígenas fossem homologadas era de cinco anos; em seu curto mandato, o presidente Collor homologou 121 delas. Foi um início animador, mas logo ficou claro que nem mesmo o que está escrito em nossa lei máxima vale. As demarcações continuaram em ritmo lento e as invasões se intensificaram. Os indígenas decidiram então se organizar politicamente. A despeito de serem 305 povos e falarem 274 línguas diferentes, há uma série de demandas em comum.

Em 2004, montaram em Brasília pela primeira vez o Acampamento Terra Livre (ATL) e no mesmo ano foi criada a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), que reúne associações de todas as regiões brasileiras. Ainda assim, em 2016, mais da metade da Terra Indígena Arariboia, lar da maioria dos Guajajara, foi consumida por um incêndio criminoso. E este foi só um dos muitos crimes.

Com a chegada ao poder de um presidente abertamente hostil às nossas causas, e apenas uma representante no Congresso — Joênia Wapichana, a primeira deputada federal indígena da História, com atuação tão marcante, dizem, “que valia por uma aldeia inteira” — era chegada a hora inevitável de buscarem a política institucional definitivamente. Não é de hoje que o mundo inteiro reconhece a importância dos povos da floresta para a preservação da natureza, o combate às mudanças climáticas e, consequentemente, a própria sobrevivência da Humanidade. Por isso, são vozes cada vez mais ativas nas Conferências do Clima, como a COP27, da qual Célia e Sônia acabaram de participar.

Bolsonaro é reconhecido pela comunidade internacional como um dos maiores inimigos do meio ambiente. Minas Gerais e Maranhão, estados natais das novas deputadas, ajudaram a derrotá-lo nas urnas. E elas pretendem colaborar para reverter no Congresso as barbaridades que este governo perpetrou contra a Amazônia e outros importantes biomas brasileiros, fundamentais para o futuro da espécie humana. Porque, como elas mesmas afirmam: “Somos guerreiras e sábias. Temos disposição para a luta e conhecimento ancestral de sobra para isso”.

Precisamos falar de racismo ambiental

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O racismo ambiental também é estrutural: já percebeu que quando se fala de mudanças climáticas, sempre aparece o urso polar se equilibrando num toco de iceberg? Ninguém se lembra que o primeiro mamífero extinto foi o rato de cauda em mosaico, um roedor marrom, endêmico de uma ilhota do Pacífico engolida pela subida do nível dos oceanos. Da mesma forma, o mundo inteiro acompanha sobressaltado a destruição causada por incêndios na Europa e nos Estados Unidos (país também ameaçado pelos furacões que assolam o Atlântico Norte). No entanto, o Hemisfério Sul, banda pobre do planeta, é o mais afetado e o menos responsável pelo desequilíbrio climático.

Essa relevância seletiva também afeta o reconhecimento dos povos que vivem abaixo da Linha do Equador e do Trópico de Câncer no combate a esse inimigo comum da Humanidade, como observa Ellen Acioli, indígena sateré-mawé e coordenadora programática do Vozes pela Ação Climática (VAC). Por isso, seis entidades, WWF Brasil, Hivos, Fundación Avina, SouthSouthNorth (SSN), Akina Mama wa Afrika e Shack Dwellers International (SDI) criaram o VAC, programa que apóia e divulga ações promovidas contra as mudanças climáticas em sete países: Brasil, Bolívia, Indonésia, Paraguai, Quênia, Tunísia e Zâmbia.

Se, ao menos no papel, acabaram os tempos do colonialismo – quando Ocidente fazia das nações mais pobres sua despensa — seus efeitos permanecem. É o que se chama de colonialidade; é como se a estrutura de poder colonial culturalmente ainda vigorasse (através do consumismo insano que tomou o planeta), mesmo séculos depois do fim do período colonial e da independência dos países explorados. Descolonizar é coisa do passado; agora é preciso decolonizar as relações entre países.

O VAC elegeu associações comandadas por mulheres e jovens da Amazônia Legal como suas porta-vozes, não só porque os povos de lá estão entre os mais atingidos, como porque há séculos eles vêm combatendo a destruição da região com ensinamentos passados de mãe para filha. É uma tecnologia, antes desprezada, que começa a ser reconhecida no mundo inteiro como a mais eficaz.

Um trabalho de décadas de conscientização sobre o manejo do pirarucu para a sua pesca sustentável, na comunidade de Tapará Mirim (Bacia do Tapajós, PA), está indo por água abaixo. Motivo: as secas constantes que vêm castigando a região. Na comunidade de São Luiz Gonzaga, onde a Associação Comunitária de Educação em Saúde e Agricultura (Acesa) cultiva agroflorestas no Médio Mearim (MA), não só os peixes estão sumindo, mas também pássaros antes abundantes, como beija-flores, bem-te-vis e anabus. Até as borboletas bateram asas para bem longe.

Por outro lado, a Arraia Mãe, encantado que protegia o Lago Verde de Alter do Chão, balneário do Tapajós — que havia se refugiado em outros mundos, assustada com o turismo predatório — prepara sua volta ao lar. Se não fisicamente, ao menos no imaginário popular, por meio do trabalho da Associação de Mulheres Indígenas Suraras do Tapajós. A colonialidade também se combate com narrativas, diz Ianny Borari, conselheira fiscal dessa entidade.

Combater a violência contra a mulher indígena e o racismo, promovendo o acolhimento e o fortalecimento da autoestima, além de contribuir para o empoderamento econômico e político e para a defesa de seus territórios, são os principais objetivos das Suraras. Estes serão alguns temas que elas, a VAC e outras organizações parceiras levarão à COP27, que acontece até 18 de novembro de 2022 em Sharm El Sheikh, no Egito. Se quisermos salvar o planeta, essas ideias precisam ser passadas adiante. Decolonizar é uma questão de sobrevivência.

Nossa Liga da Justiça

Nossa Liga da Justiça

O adversário foi desleal: não teve escrúpulos em usar armas de fogo, a mentira, sua falsa crença em Deus e até mesmo doenças — numa espécie de guerra biológica — para impor a sua vontade. Essa história aconteceu nos anos 1500, mas se repetiu como farsa nas últimas eleições. Realmente é assustador ver o Senado se transformar numa espécie de filial do Asilo Arkham — manicômio judiciário para onde são mandados os inimigos mais perigosos do Batman nos filmes e nos quadrinhos, como Coringa, Charada e Hera Venenosa. Mas, como diz a canção de Ivan Lins, “desesperar jamais, aprendemos muito nesses anos”. E este aprendizado nos rendeu vitórias históricas, que irão nos ajudar a “não entregar o jogo no primeiro tempo”, seja lá qual for o presidente eleito. Bola pra frente!

Quem teria mais a ensinar sobre a boa luta que os povos originários? Eles vêm resistindo há 522 anos e mantiveram a Amazônia praticamente intocada até as últimas décadas do século passado. Perdemos a combativa Joênia Wapichana — que deixou a Câmara Federal em alto estilo, aprovando o decreto que mudou o nome do Dia do Índio para Dia dos Povos Indígenas, aquele que Jair Bolsonaro tentou vetar —, mas em compensação o número de representantes dos povos originários eleitos em 2022 foi recorde. Sonia Guajajara, em São Paulo, e Célia Xakriabá, em Minas Gerais, fazem parte da Bancada do Cocar, lançada pela Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil), que indicou 30 candidaturas indígenas pelo país e conquistou mais de 446 mil votos. Já Juliana Cardoso, ligada ao movimento indígena urbano, é a primeira deputada federal indígena eleita pelo PT em São Paulo. Há ainda outros quatro parlamentares eleitos que se autodeclararam indígenas, entre apoiadores do ex-presidente Lula e do atual presidente, Jair Bolsonaro.

Ex-coordenadora executiva da Apib, Sonia, que já havia sido candidata à Vice-Presidência da República na eleição passada, foi considerada uma das 100 pessoas mais influentes do mundo, segundo a revista “Time”. Eleita por São Paulo com quase 157 mil votos, em voz ativa nos mais importantes fóruns internacionais, como a ONU. Já Célia Xakriabá, integrante da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga) une sabedoria ancestral e educação formal: é Mestra em Desenvolvimento Sustentável e Doutora em Antropologia na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). E como fala bem: foi apresentadora do podcast “Papo de Parente”, da Globoplay, no qual ajudou a popularizar ainda mais a cultura indígena e recebeu o aval de mais de 100 mil mineiros. Imaginem o que essa dupla vai aprontar no Congresso? Só de pensar nos discursos já bate uma ansiedade.

A bancada indígena terá uma aliada de peso: a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva, uma extrativista que lutou lado a lado com Chico Mendes, no Acre. Nunca é demais lembrar que ela estava à frente da pasta quando foi implantado o Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), desmantelado pelo governo atual. Graças e ele o desmatamento na região caiu de 27.772 km² para 4.571 km² entre 2004 e 2012. Entre agosto de 2021 e julho de 2022, período que compreende o chamado ‘calendário do desmatamento’, a área devastada chegou a 10.781 km² – foi o segundo recorde negativo consecutivo. E, até agosto, a maior floresta tropical do mundo já havia perdido quase 8 mil km² de verde, a pior marca dos últimos 15 anos, segundo o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). A volta de Marina a Brasília não poderia ter acontecido em melhor hora.

Outros importantes movimentos sociais também garantiram sua representatividade no Congresso. Os paulistas deram mais de um milhão de votos a Guilherme Boulos, do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Sem Teto (MTST), que lhe garantiram o segundo lugar entre os deputados mais votados do país. Já o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o maior produtor de arroz orgânico da América Latina conseguiu furar o bloqueio das fake news e do preconceito, e emplacou dois nomes na Câmara Federal: o baiano Valmir Assunção e o gaúcho Marcon. A bancada ruralista agora terá um contraponto ao seu discurso hegemônico e nós ganhamos reforço na luta por comida mais saudável em nossas mesas.

O Quilombo nos Parlamentos garantiu 26 cadeiras do movimento no Congresso e em assembleias estaduais. Dos 14.712 candidatos autodeclarados pretos ou pardos nesta eleição, 525 foram eleitos — um aumento de 10,78% em relação a 2018. E, pela primeira vez, duas mulheres trans, Erika Hilton e Duda Salabert, garantiram assento na Câmara.

Foi uma vitória não só dos movimentos populares, da bancada do Cocar ou do Quilombo nos Parlamentos, mas da própria democracia. Ainda estamos longe do ideal, mas já é um Brasil com mais cara de Brasil, um país que tem em sua sociobiodiversidade uma de suas maiores riquezas, e que joga no ataque no campo da preservação do meio ambiente. Não será fácil, mas podemos virar esse jogo. Por isso, “nada de correr da raia, nada de morrer na praia”.

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Vote Verde. Vote pelo socioambiental. Vote no futuro!

Vote Verde. Vote pelo socioambiental. Vote no futuro!

por Danielle Amaral* e Gabriela Borges*

A cena se passa em 2022. O projetor das eleições é ligado e a tela finalmente dá protagonismo a quem por muitos anos foi relegada ao papel de coadjuvante: a juventude. Segundo o IBGE, 47 milhões de brasileiros têm de 15 a 29 anos. Por outro lado, a população brasileira está envelhecendo rapidamente. Hoje, são 15,7% de pessoas com mais de 60 anos e a Organização Mundial de Saúde calcula que até meados dos anos 2050 um em cada três brasileiros terá ultrapassado essa idade. Por isso é fundamental apontar os holofotes para quem cuidará do país no futuro, caso a gente queira um final feliz.

Não é o que tem acontecido. Uma pesquisa feita pela ONG Engajamundo, em parceria com os Institutos Cíclica e Veredas, comprova que nos últimos dois anos as políticas públicas para jovens foram reduzidas pela metade. Os dados apresentados demonstram uma negligência ainda maior aos mais vulneráveis, como as juventudes negra, indígena e LGBTQIA+. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) registra mais de 21 milhões de eleitores na faixa dos 16 a 24 anos. Os jovens têm o poder e o dever de mudar esse roteiro trágico.

Incentivo para isso não faltou. Foram várias as iniciativas para impulsionar a participação desse grupo na política, principalmente no que diz respeito ao primeiro voto. Dada a largada do ano de eleitoral, o TSE e ONGs como o Nossas entraram de cabeça nessa campanha. A mobilização tomou conta do país, e artistas como Anitta, Juliette, Bruna Marquezine, Zeca Pagodinho – e até mesmo estrangeiros, como Mark Ruffalo e Leonardo DiCaprio – entraram na ciranda para estimular jovens de 16 e 17 anos a tirarem seus títulos de eleitor. E muita gente caiu nessa dança.

Mesmo que o voto seja facultativo para essa faixa etária, o resultado de tanta mobilização foi bastante fértil: entre janeiro e abril de 2022, o país ganhou mais 2.042.817 jovens eleitores, um aumento de 47,2% em relação ao mesmo período em 2018. Esse é só o início da realização de nossos sonhos, que serão construídos nas urnas. Como canta o pernambucano Siba, “cada vez que eu dou um passo, o mundo sai do lugar”. O primeiro passo foi dado, o objetivo agora é que o mundo saia do lugar de encontro à juventude!

Mas a luta só começou. Só 3% dos deputados federais têm menos de 30 anos; a imensa maioria já passou dos 50. Como ninguém vive para sempre, seu futuro tem um horizonte curto: boa parte deles não estará mais entre nós em 30 anos. E é justamente a Câmara que cria as leis e fiscaliza o Poder Executivo. Entendeu agora porque não estamos incluídos na construção de políticas públicas justas para o nosso perfil? É preciso começar a ocupar esse espaço também. Porque o perigo mora ao lado, não só em Brasília

O voto jovem precisa ter consciência de que só votar no melhor candidato para Presidente da República não resolve. Deputados, senadores e governadores também são responsáveis por decidir os caminhos de nossas vidas. E são eles que estão logo ali nas ruas disputando votos no corpo a corpo. O que podemos esperar do futuro num país que corre na Câmara a aprovação para o Pacote Veneno – que libera muito mais agrotóxicos no Brasil, aumentando os danos à saúde pública e ao meio ambiente – assim como outros Projetos de Lei que limitam a demarcação e liberam a mineração em terras indígenas, além de estimularem e a grilagem e a violência.

O agora deles é o nosso futuro. O Greenpeace Brasil lançou a campanha Voto Sem Vacilo, com o objetivo de conscientizar o jovem – mas não só ele –, de forma lúdica e didática, sobre a importância do voto socioambiental. No seu site, o eleitor encontra um guia que descreve as pautas que estarão em jogo depois das eleições e quais as candidaturas estão verdadeiramente comprometidas pautas ligadas à preservação do meio ambiente e com o bem-estar da sociedade.

Nesse momento, o tique-taque do relógio do fim do mundo está acelerado e indica para um esgotamento do planeta num futuro próximo. Sequer sabemos se ainda há tempo para fazer frente às mudanças climáticas. A questão é que, daqui a 10, 20, 30 anos, serão os jovens que estarão aqui para ver o resultado dessa aposta arriscada no desenvolvimento a qualquer preço. E o seu voto vale muito mais que dinheiro.

O filme ainda não acabou. Por isso, ainda que a urna seja uma caixa pequena demais para guardar todos os nossos sonhos, ela é a nossa principal esperança de garantirmos o desfecho que merecemos. Um futuro que não se inicia no amanhã; para nós ele acontece no agora. Vote socioambiental, vote verde, vote jovem!

*Danielle Amaral é mulher preta nordestina e interiorana. É formada em Relações Internacionais, ativista socioambiental e Diretora Executiva da ONG Engajamundo.
*Gabriela Borges: Não binárie, graduanda em Psicologia, ativista, pesquisadora e comunicadora na ONG Engajamundo e é responsável pelas redes sociais da Uma Gota no Oceano.

 

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