A Justiça tarda e falha com Mariana

A Justiça tarda e falha com Mariana

A Justiça tarda e falha com Mariana. O processo que julga os responsáveis pela maior tragédia ambiental do país está paralisado, por determinação do juiz Jacques de Queiroz Ferreira, da comarca de Ponte Nova (MG). Ele também corre o risco de ser anulado a pedido da defesa, sob a alegação de que houve ilegalidade na quebra de sigilos telefônicos nas investigações.

Desde outubro do ano passado, a mineradora Samarco e suas proprietárias, Vale e BHP Billiton, além de 21 diretores das empresas, foram denunciados pelo Ministério Público Federal e respondem por homicídio com dolo eventual (quando se assume o risco de matar), lesões corporais graves e crimes ambientais. A tragédia devastou povoados inteiros e matou 19 pessoas, além de contaminar mais de 600 quilômetros do Rio Doce. Esses crimes não podem ficar impunes.

Via El País Brasil

Foto: Ana Branco/Agência Globo

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Rio Doce entra na Justiça

Rio Doce entra na Justiça

Como ninguém ainda pagou o pato por Mariana, o próprio Rio Doce vai tomar uma providência: já que dois anos se passaram e quase nada aconteceu, ele próprio entrou na Justiça. A ação foi ajuizada contra os governos federal e de Minas Gerais, e o rio foi representado pela Associação Pachamama.

O que aconteceu com o Rio Doce segue uma tendência: o Ganges, na Índia, e o Whanganui, na Nova Zelândia, foram declarados pessoas jurídicas. Isso acelera os processos contra os responsáveis por agressões contra eles e ao meio ambiente. Os rios carregam a vida em seus leitos: protegê-los é uma coisa obrigatória para quem tem juízo.

Via Gazeta Online

Foto: Douglas Magno

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Mariana: dois anos como um dia

Mariana: dois anos como um dia

Parece que foi ontem. A tragédia de Mariana está fazendo dois anos, mas para as vítimas do maior desastre ambiental do país, é como se tivesse se passado só um dia: ninguém foi julgado, indenizações não foram pagas, o Rio Doce continua morto e cerca de mil pessoas ainda não receberam suas novas casas. Mais de 700 dias se passaram, mas o luto dos 540 Krenak não tem dia para passar, desde que 34 milhões de metros cúbicos de lama tóxica tomaram o rio que chamam de Uatu e praticamente extinguiu sua cultura. As crianças hoje aprendem a nadar em caixas d’água e os remédios, tirados da flora nativa, agora precisam ser comprados em farmácias. As cerimônias à beira do rio acabaram e houve quem morresse de depressão, tamanha a tristeza. 

Morando provisoriamente em Mariana, em imóveis alugados, famílias atingidas pelo desastre dos distritos rurais de Paracatu e Bento Rodrigues, além de enfrentarem a incerteza, chegam a ser hostilizadas por locais. E devem esperar ainda mais dois anos até que suas novas casas fiquem prontas. O desemprego no município saltou de 5% para 23% desde que as atividades da Samarco foram suspensas. A lama virou poeira tóxica e está espalhando doenças pela região. Os doentes não recebem tratamento adequado: às vezes, mães precisam escolher qual filho levarão ao médico. Em novembro do ano passado, a Justiça Federal em Ponte Nova (MG) aceitou a denúncia do Ministério Público Federal contra 22 pessoas e as empresas Samarco, Vale, BHP Billiton e VogBR pelo rompimento da barragem de Fundão. Mesmo com responsabilidade comprovada, ninguém ainda foi condenado. Brechas na lei congelam o tempo em Mariana.

Samarco e suas controladoras (Vale e BHP) criaram a Fundação Renova para fazer o trabalho social, o de reconstrução e o de restauração ambiental. A previsão é que remoção de resíduos acabe em 2020, e que R$ 2 bilhões sejam pagos em indenizações, mas ainda não se tem a real dimensão do tamanho do desastre. O equivalente a 120 navios petroleiros de lama desceu 55 km do Rio Gualaxo do Norte e mais 22 km do Rio do Carmo até ambos desaguarem no Rio Doce. De lá, rumou para o mar, no município de Regência (ES), percorrendo ao todo 663 km. Não dá para saber ainda qual será o tamanho do estrago no litoral, já que a foz do rio continua a despejar rejeitos. A única certeza a respeito de Mariana é que não devemos esquecer dela, para que tragédia igual nunca se repita.

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Rio Doce: doente crônico

Rio Doce: doente crônico

O diagnóstico foi dado ontem, por cientistas de três universidades brasileiras: o Rio Doce sofre de um mal crônico e precisa de medicamentos de uso contínuo. Caso não se trate o paciente, a lama tóxica que destruiu Mariana e corre em seu leito também afetará gravemente a saúde do banco de Abrolhos, a maior formação de recifes de coral do Atlântico Sul.

A prescrição recomendada: o monitoramento contínuo dos rejeitos que vazaram barragem da Samarco/Vale.

O estudo é resultados de três expedições de avaliação de impactos na foz do rio e é o mais completo feito até hoje.

Mariana não deixará que a gente se esqueça dela.

Foto: Ricardo Moraes/Reuters

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Refugiados do clima e do descaso

Refugiados do clima e do descaso

Segundo o Alto Comissariado da ONU para Refugiados (Acnur), o número de refugiados e deslocados no mundo atingiu 65,6 milhões de pessoas no ano passado, um crescimento de 300 mil na comparação com 2015 (saiba mais aqui). Por trás de cada refugiado geralmente há um ato de violência, direto ou indireto. E ele não precisa estar fugindo de conflitos armados. Hoje, pode-se dizer isso, inclusive, de vítimas de catástrofes naturais. O descaso com o meio ambiente é uma forma de violência – e das mais destrutivas.

Hoje é o Dia Mundial do Refugiado, dia para a gente se lembrar que atualmente as mudanças climáticas estão entre as maiores responsáveis pelos fluxos migratórios. Em 2014, calcula-se que houve 19,3 milhões de refugiados climáticos no mundo, conforme o último relatório do Centro de Monitoramento de Deslocados Internos (IDMC). Já a Acnur estima que serão aproximadamente 250 milhões até o fim do século. O ano de 2016 foi o mais quente da História e caso a temperatura do planeta continue a subir, o número de fenômenos climáticos extremos crescerá no mesmo ritmo: foram registrados 750 em 2016, contra uma média de 590 casos nos últimos dez anos. 

A política desenvolvimentista adotada há cerca de uma década no Brasil, aliada à negligência e à ganância, gerou dois casos emblemáticos de refugiados socioambientais, que são refugiados em seu próprio país. A exploração desmedida de nossos recursos naturais causou a tragédia de Mariana e abandonou à própria sorte a população da região do entorno da Usina de Belo Monte. A área inundada para encher o reservatório da hidrelétrica foi de 500 quilômetros quadrados, o tamanho da cidade de Curitiba. Com a inundação, cerca de 10 mil famílias do município de Altamira tiveram que deixar para sempre suas casas, que muitas vezes abrigaram gerações. O número de indígenas afetados direta ou indiretamente na região chega a 20 mil. O vazamento da barragem de Samarco/Vale que matou o Rio Doce deixou 303 famílias desalojadas.

Essas pessoas não perderam somente suas casas, mas também suas identidades culturais – no caso dos povos indígenas, dá para se falar em etnocídio. E caso nada seja feito, casos como estes podem se tornar comuns. Só ao longo do Rio Amazonas há 140 barragens em funcionamento ou em construção e outras 428 estão planejadas. E a qualquer momento pode ser aprovado no Congresso o Projeto de Lei que flexibiliza as regras do licenciamento ambiental. A licença de instalação da mineradora canadense Belo Sun à beira do Xingu no momento está suspensa, mas a decisão pode ser revertida; até hoje, a Samarco/Vale sequer pagou um centavo dos R$ 344,8 milhões em multas aplicadas pelo Ibama, que autuou a empresa 23 vezes. Imaginem o que está por vir. Por isso é preciso resistir e reagir.  

Foto: Getty Image

 

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