Só o Brasil real salva o Brasil do Brasil oficial

Só o Brasil real salva o Brasil do Brasil oficial

“O país real, esse é bom, revela os melhores instintos; mas o país oficial, esse é caricato e burlesco”, dizia Machado de Assis, em 1861. Não é de hoje que quem manda no Brasil (o país oficial) não está à altura de seu povo (o real); mas raras vezes essa disparidade ficou tão evidente quanto agora. Enquanto o governo toma decisões que agridem nossa dignidade e nos isolam cada vez mais do resto do mundo, cidadãos brasileiros buscam soluções para essas adversidades e ganham até reconhecimento internacional. Ao mesmo tempo em que descobrimos que 33 milhões de pessoas, quase meia França, passam fome no Brasil, a etnobióloga Patrícia Medeiros é premiada naquele país por seus estudos sobre o uso de plantas silvestres como alimento. Não só comemos pouco, como comemos mal.

A pernambucana de 35 anos, que é professora da Agroecologia e Engenharia Florestal na Universidade Federal de Alagoas (Ufal), foi uma das 15 ganhadoras do International Rising Talents, concedido a jovens cientistas mulheres pela Fundação L’Oréal, em parceria com a Unesco. “Hoje nós comemos pouquíssimas coisas. No Brasil e no mundo, nossa alimentação é baseada em poucas espécies convencionais”, diz Patrícia. O problema é que esses alimentos têm deficiências de micronutrientes, como ferro, cálcio e outros minerais fundamentais para uma boa nutrição. Já as plantas silvestres são ricas nessas substâncias.

No cardápio elaborado por ela entram araçá, jenipapo, taioba, cambuí e ouricori, que muitas vezes não chegam aos nossos pratos por puro preconceito. Esse menu mais variado ajudaria a atacar mais duas calamidades: a perda da biodiversidade – muitas dessas plantas estão dando espaço para monoculturas como o da soja, do milho e da cana-de-açúcar – e o uso cada vez mais desmedido de agrotóxicos e fertilizantes químicos, já que são naturalmente adaptadas aos seus biomas nativos.

Em seus estudos, Patricia mira outro problema que vem sendo solenemente ignorado pelo “país oficial”: as consequências das mudanças climáticas. “Quanto mais diversas forem nossas opções alimentares, há mais chances de ter elementos com os quais contar no futuro incerto. Há espécies mais resistentes às altas temperaturas e, principalmente, à ausência de chuvas”, explica. E foi justamente a preocupação com o caos que pode ser causado pelo desequilíbrio climático que rendeu a outro brasileiro, o climatologista Carlos Nobre, uma honraria inédita: ser o único brasileiro eleito para a Royal Society, a academia de ciências mais antiga do mundo, sediada em Londres – Dom Pedro II chegou lá antes, mas por causa de seu pistolão de imperador (o “país oficial”), não por suas pesquisas.

Um estudo publicado em março pelo jornal científico “Nature Climate Change” mostrou que, nos últimos 20 anos, a maior floresta tropical do mundo, também vital para ajudar a regular o clima do planeta, vem demorando cada vez mais para conseguir se recuperar dos longos e cada vez mais constantes períodos de seca. Isso está a deixando mais perto de seu ponto de inflexão, quando não terá mais capacidade de regeneração.

Nobre foi o primeiro a calcular este limite, em 2007: isso aconteceria se 40% da Floresta Amazônica fossem abaixo. Dez anos depois, as estimativas foram refeitas, mostrando-se ainda mais preocupantes: 20% de destruição decretaria sua sentença de morte – ou mesmo aterradoras, se levarmos em conta que, segundo a ONG The Nature Conservancy, essa porcentagem já foi atingida. “Nos últimos três anos e meio, com o atual governo federal do Brasil, vimos um descontrole proposital, uma política de expandir a agropecuária, de levar a mineração a tomar tudo ali, áreas indígenas, protegidas, tudo. Nós voltamos, por incrível que pareça, para as décadas de 1970 e 1980”, denuncia Nobre.

O Brasil real dos povos originários é a nossa maior esperança de salvar a Amazônia. O papel das terras indígenas tem sido fundamental: segundo um levantamento da plataforma Mapbiomas, entre 1985 e 2020 só 1,6% da perda de cobertura florestal no país se deu nesses territórios, e quase 20% de toda a vegetação nativa do país estão localizados neles. Não à toa, enquanto o presidente da República foi barrado no último encontro do G7, Sonia Guajajara, uma das vozes mais ativas do movimento indígena, entrou para a prestigiada lista das cem pessoas mais influentes do mundo da “Times”.

Outro brasileiro lembrado pela revista americana foi o pesquisador Tulio de Oliveira, descobridor variante Ômicron do novo coronavírus. Desnecessário relembrar o desempenho catastrófico do “país oficial” no combate à Covid-19. Mas um estudo do Banco Mundial diz que a pandemia fez o Brasil andar dez anos para trás. Segundo o relatório, desperdiçamos 40% do potencial de nossas crianças – o PIB do país poderia ser 158% maior, caso o aproveitamento fosse de 100%. As razões são diversas, vão da falta de emprego, educação e alimentação deficientes, às desigualdades de gênero e raciais.

Além disso, os cortes promovidos pelo governo na área de ciência e tecnologia ainda tem provocado uma fuga de cérebros. Tulio de Oliveira, por exemplo, é diretor do Centro de Resposta e Inovação Epidemiológica da África do Sul. O Banco Mundial estima que o Brasil precisaria de 60 anos para alcançar o nível de capital humano alcançado pelos países desenvolvidos há três anos. É muito tempo para recuperar. O capital humano é outro recurso natural do qual somos ricos, mas que também não podemos nos dar ao luxo de desperdiçar. É hora de o Brasil real salvar o Brasil do Brasil oficial.

 

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Lugar ao sol

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Que tal usar o sol para esfriar o planeta?

“Conta de luz puxa inflação”, avisam os jornais. A notícia que dói no bolso representa também uma enorme dor de cabeça. Não basta o brasileiro ter de escolher entre ter água para beber ou gerar eletricidade; não basta ainda ter gente querendo convencê-lo de que pôr florestas abaixo para construir hidrelétricas é investir em “energia limpa”; não basta dependermos de ultrapassadas termelétricas, movidas a carvão e gás natural, para manter o país aceso. Faltava a cereja do bolo, quer dizer, a bandeira vermelha cravada na tarifa. E o pior é perceber que está tudo interligado, com o perdão do trocadilho. A poluição gerada por termelétricas e hidrelétricas bagunça o clima, as secas se tornam mais frequentes e quando a gente vê, está levando um saco cheio de dinheiro para comprar um quilo de feijão. É uma cadeia insustentável e aparentemente, sem solução. Mas só aparentemente.

E o problema não é só nosso. O Departamento de Informações Energéticas dos EUA (EIA, na sigla em inglês) estima uma queda este ano de 11% na geração de eletricidade a partir de hidrelétricas. O país é o terceiro maior gerador hidrelétrico do mundo, ficando atrás de China e Brasil. A seca que ora castiga a Califórnia reduziu em 40% a energia produzida por esta fonte – a famosa Represa Hoover, a maior do país, está com seu nível mais baixo desde 1937, o ano seguinte à sua inauguração. Mas esta fonte responde por somente por 7,3% da energia produzida no país, ficando atrás da eólica (8,4%), carvão (19%), nuclear (20%) e gás natural (40%). Aqui, são 59,4%; fechou a torneira, já era. “A seca está prestes a se tornar a próxima pandemia e não há vacina para curá-la”, advertiu Mami Mizutori, representante especial do secretário-geral da ONU para redução de risco de desastres, no lançamento do último relatório da entidade sobre o tema, na semana passada.

No último dia 6, a Agência Nacional Oceânica e Atmosférica (NOAA, na sigla em inglês), órgão oficial do governo americano, nos deu uma boa razão para preocupação. Mesmo com a economia ainda sem trabalhar a todo vapor, o órgão registrou a maior concentração de CO₂ na atmosfera terrestre, desde que começaram as medições, em 1958. Ou seja, a transição energética é um caso de sobrevivência da espécie. O sol, que ainda vai brilhar por pelo menos mais 7 bilhões de anos, parece ser a aposta mais segura. Tanto que em março, o presidente americano Joe Biden estabeleceu a meta de diminuir o custo de sua instalação em até 60% até 2035. Em seu último relatório, publicado em maio, a Agência Internacional de Energia (AIE) concluiu que a energia solar, que hoje representa só 1% do total global, será a maior fonte de energia do mundo em 2050, com 20%.

Segundo um relatório lançado em janeiro último pela Wood Mackenzie, empresa de consultoria e pesquisa em energia, o custo da eletricidade gerada pelo sol caiu 90% nos últimos 20 anos e pode diminuir até mais 25% na próxima década. Assim, se tornaria a fonte de energia mais em conta nos Estados Unidos, Canadá, China e outros 14 países. Mesmo com a economia em compasso de espera, o setor aqui gerou mais de 86 mil empregos em 2020 e a geração cresceu 64% em comparação com 2019, de acordo com a Associação Brasileira de Energia Solar (Absolar); também no ano passado, o Brasil entrou na lista dos dez países que mais instalaram sistemas de geração fotovoltaica no mundo, segundo a AIE. A consultoria Bloomberg New Energy Finance calcula que aproximadamente 32% da energia nacional viria do sol, enquanto a hidrelétrica cairia para 30%.

Isso torna ainda mais inexplicável a emenda que a MP da Eletrobras ganhou no Senado: ela prevê a contratação obrigatória de 8 GW de termelétricas a gás natural. “Apenas com o custo de construção das usinas, os 8 GW de térmicas a gás natural previstas podem construir, dependendo dos parâmetros, entre 8 e 13 GW de usinas solares. Esta comparação não considera o elevado custo de combustíveis, que tem custo zero para as plantas solares. Se contabilizada esta despesa, considerando os 15 anos de operação previstos para essas térmicas, seria possível construir ainda mais usinas solares”, diz Ricardo Baitelo, coordenador de projetos do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema) e conselheiro de Uma Gota no Oceano.

Diversificar as fontes de energia é fundamental, para que a gente não caia no mesmo problema futuramente. Mas não dá para investir em obras caras que são elefantes brancos anunciados. “A complementação da geração hidrelétrica, que antes só contava com as termelétricas a combustíveis fósseis, hoje em dia pode ser feita com termelétricas a biomassa. As movidas a bagaço de cana têm a vantagem de terem o insumo para geração concentrado nos meses de seca, entre maio e novembro, e o mesmo vale para eólicas, com melhor perfil de vento nesse período”, explica Baitelo. “Já a geração fotovoltaica, embora não produza energia quando não há sol, tem a vantagem de gerar energia durante o ano todo e esta geração acompanha a curva de carga de setores de consumo como o comercial e o industrial. Ou seja, há produção de eletricidade das 6h às 18hs, aproveitando também o uso mais acentuado de ar condicionado no setor residencial”, completa ele.

Detalhes fornecidos pela Absolar indicam uma tendência: cerca de 80% das instalações foram de geração distribuída, aquelas placas azuis que são instaladas em telhados de casas e edifícios. Elas responderam por 2,5 GW gerados no ano passado, contra quase 617 MW das grandes usinas. O barateamento do equipamento está fazendo as pessoas buscarem autonomia energética – tanto por questões econômicas quanto práticas ou estratégicas. Por serem relativamente fáceis de instalar e baratas, as placas azuis têm levado eletricidade tanto aos povos da Amazônia como à população de Idlib, por exemplo. A província da Síria foi controlada por rebeldes que lutam Bashar Assad e, por isso, teve seu fornecimento cortado pelo governo – os mais vendidos são painéis canadenses usados que saem a US$ 38. Enquanto os indígenas usam o sol para conectar suas aldeias com o mundo, as famílias sírias ligam a geladeira ou a máquina de lavar de dia e assistem TV à noite. Um sistema descentralizado evitaria a construção de linhas de energia, como a que o governo ameaça passar pela Terra Indígena Waimiri-Atroari, para levar eletricidade a Roraima. Ou situações tragicômicas que vivemos hoje, como a entrada em manutenção de termelétricas justamente no início da temporada de seca – momento em que a produção de energia nas barragens desaba.

Outro erro que não podemos incorrer é o de negligenciar os impactos ambientais que podem ser causados pelo mau uso da energia solar, como fizemos com os combustíveis fósseis e as hidrelétricas. A Agência Internacional de Energia Renovável (Irena, na sigla em inglês) calcula que a vida útil de 60 milhões de toneladas de painéis solares deve terminar até 2050. Só no Brasil, serão 300 mil toneladas. O que fazer com tanto lixo eletrônico? Simples: 95% dos componentes dos paineis são recicláveis. Com os equipamentos que vencem até 2050, será possível fabricar 2 bilhões de novos painéis, que produziriam 630 GW e injetariam US$ 14 bilhões na economia. Além disso, é uma tecnologia que vem avançando muito rapidamente e, num futuro não muito distante, teremos painéis biodegradáveis. Que tal usar o sol e a cabeça para esfriar o planeta?

#EnergiaSolar #MeioAmbiente #MelhoraEsseClima #MudançasClimaticas #Brasil #EmissoesdeCarbono

 

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Copo meio cheio

Copo meio cheio

As mudanças climáticas estão abalando as estruturas não só do mundo ocidental, como também do oriental. Literalmente e metaforicamente. Um estudo da Academia Chinesa de Ciências e da Universidade Técnica da Dinamarca indica que o descontrole no clima vem causando alterações no eixo de rotação da Terra desde os anos 1990. A razão é a redistribuição do volume de água no planeta, causada pelo degelo dos polos – afinal, H₂O pesa. Por outro lado, depois da Cúpula do Clima convocada por Joe Biden, já é possível vislumbrar o copo meio cheio – no bom sentido, é claro. As grandes potências parecem ter acordado para o significado da expressão emergência climática, o que é ótimo. O próprio presidente americano disse que é preciso limitar em 1,5°C o aumento médio da temperatura global até 2100 – o Acordo de Paris prevê, oficialmente, 2° C. “Estão deixando a gente sonhar”, já dizia o filósofo Ronaldinho Gaúcho.

É claro que nem tudo são flores. De acordo com a mesma pesquisa, caso as emissões de gases do efeito estufa continuem em desabalada carreira, o Ártico pode descongelar nos verões de 2040 em diante. O pior é que a economia mundial pode derreter junto. O quadro é tão sério que até o presidente brasileiro foi obrigado a reconhecer que as mudanças climáticas são resultado da ação humana, um dos últimos bastiões de sua cartilha negacionista. Caso o governo não demonstre seriedade, periga o Brasil ser abandonado no século XX por seus pares. Certa vez, o ex-presidente Collor comparou os carros brasileiros a carroças. Essa hipérbole pode deixar de ser figura de retórica: se até os Estados Unidos, que têm o petróleo entranhado em sua cultura, vão apostar na eletrificação de automóveis, quem vai comprar lá fora uma peça de museu movida a suco de dinossauro?

A boa notícia é que, com a água batendo em lugares, digamos, desagradáveis, os países começaram a se mexer. Na véspera da cúpula, a União Europeia (UE) anunciou que o bloco vai zerar as emissões de CO₂ até 2050 e as reduzirá em 55 % em relação aos níveis de 1990; Vladimir Putin, presidente da Rússia, se comprometeu a atingir neutralidade em carbono até 2025; e o Japão, a diminuir em 46%, até 2030. Os americanos também deram uma cartada alta: afirmaram que vão cortar as emissões de carbono em até 52% até 2030 – na era Barack Obama, a meta era reduzir de 26 a 28% até 2025. A onda verde contagiou até o presidente brasileiro, que prometeu duplicar a verba da fiscalização ambiental no encontro de líderes – para, no dia seguinte, cortar o orçamento do Ministério do Meio Ambiente. Como diz o ditado, o que é bom dura pouco. Nesse caso, muito pouco mesmo.

O fato é que águas passadas não movem moinhos e o mundo parece mesmo estar finalmente enxergando com novos olhos a questão ambiental. Na cúpula, Joe Biden falou explicitamente nos empregos que a indústria de energia eólica poderia gerar. Os líderes das principais nações agem por duplo pragmatismo. “Ações sobre o clima não são necessárias apenas para o futuro de nossas vidas e meios de subsistência. A ação climática é o principal motor do crescimento; é a história de crescimento do século XXI”, disse o ex-economista-chefe do Banco Mundial, Nicholas Stern. Gina McCarthy, assessora nacional de clima do presidente americano, foi ainda mais sincera: “É por isso que tantas pessoas estão se interessando pela questão das mudanças climáticas. Porque agora está sendo apresentado como uma oportunidade”. É como se alguém enfim tivesse lido o cartaz há anos exibido pelos ambientalistas, que diz “Quer saber como salvar a humanidade e ainda ganhar um troco? Pergunte como!”, e pensado “Hmmm… Acho que isso me interessa”. Óbvio que interessa!

Oba-oba à parte, é hora de arregaçarmos as mangas e trabalharmos por um mundo mais sustentável. Afinal, o copo só está meio cheio. É claro que esta missão envolverá desafios. Como ajudar, por exemplo, James Owuor? Retratado pela revista Time, este queniano viu as mudanças climáticas causarem o aumento das chuvas e a subida das águas em 12 metros no Lago Baringo, na região onde vivia. Com isso, ele perdeu não só sua casa como seu emprego em um resort que existia na região e teve de fechar. O que faremos em casos como este? As nações ricas sabem que as menos favorecidas vão precisar de ajuda para fazer a transição para uma economia mais sustentável. EUA, Noruega e Reino Unido criaram um fundo para brecar o desmatamento e o anfitrião Joe Biden também anunciou na cúpula que vai dobrar as verbas para ações climáticas em países em desenvolvimento. O Brasil já falou alto quando o assunto era o meio ambiente. Em vez de pedir dinheiro em troca da proteção da Amazônia, nós, brasileiros, deveríamos liderar essa revolução verde e ajudar o mundo a superar essa emergência. Em nome de que abrir mão desse privilégio?

 

#MeioAmbiente #MudançasClimaticas #Brasil #EmissoesdeCarbono

 

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A Era de Aquário está dentro de nós

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Dizem que o astrônomo maia trocou as bolas na hora de escrever a data do Juízo Final e, em vez de 2021, anotou 2012 no famoso calendário. Fato ou fake, a história rendeu um bom meme na internet e realmente 2020 nos deixou com um pezão atrás em relação ao futuro. Por outro lado, Júpiter e Saturno se alinharam em 21 de dezembro. O fenômeno conhecido como Estrela de Belém brilhou de novo no céu e, para muita gente, marcou o início da Era de Aquário. Um tempo no qual “a paz guiará os planetas e o amor comandará as estrelas”, como diz aquela música do “Hair”. A esta altura do campeonato, uma mudança que cairia bem para o nosso surrado planetinha. Resta saber se ela virá das estrelas ou partirá de nós mesmos.

Cada era astrológica dura mais de 2000 anos. Há quem acredite que, tecnicamente, ainda estamos na Era de Peixes, que antecede Aquário. Astrologia é interpretação; por isso, não existe consenso. Para alguns, a Era de Aquário começou em 2000. Para outros, só vai dar as caras em 2600 e há quem diga que somente no ano 3000. O florescer das religiões, as guerras por conta de ideologias e a dedicação dos homens a ideais que nunca se tornaram realidade foram algumas das marcas da Era de Peixes. Já para Era de Aquário, as expectativas são bem mais animadoras.

Espera-se que seja um tempo em que a humanidade reformule a vida em sociedade e o entendimento entre os indivíduos. Movimentos sociais ganharão relevância; o consumo consciente, novos adeptos. A intuição cederá espaço a um ser humano mais lógico e racional. Se tudo isso se cumprir nos próximos tempos, a Era de Aquário terá saído melhor do que encomenda. Imagine um mundo em que indígenas e quilombolas são reconhecidos e respeitados, em que ninguém compra mais do que precisa e que aproveitamento e preservação da natureza são apenas dois lados de uma mesma moeda. Tudo isso se encaixa na descrição acima, o que nos faz querer que esta tal era comece o quanto antes.

“Harmonia e entendimento, solidariedade e abundante confiança, nada mais de falsidade ou menosprezos”, cantavam os cabeludões de “Hair”. Sejamos sinceros: para alcançar estes objetivos, dependemos menos dos astros do que de nós mesmos. A capacidade que tivemos de colocar o planeta na atual embrulhada é equivalente ao nosso potencial de criarmos um outro tempo guiado por novos valores. Se a era vai ser de Peixes ou de Aquário, tanto faz. O importante é que seja diferente. E essa mudança precisa partir de nós.

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Gestão incompetente

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Uma única empresa de tecnologia americana, a Apple, vale US$ 2 trilhões (cerca de R$ 11 trilhões), um valor maior do que o PIB do Brasil – que não chega a US$ 1,9 trilhão. Mesmo que fosse possível desmatar toda a Amazônia para plantar soja, criar gado e extrair ouro, dificilmente deixaríamos de ser um país pobre. Isso na melhor das hipóteses, pois a ambição máxima do exportador de commodities é conseguir vender o almoço para pagar a janta. Por outro lado, a floresta nos oferece a oportunidade de produzir tecnologia de ponta para o novo modelo econômico que se desenha. Agora, imaginem se a direção da Apple tivesse percebido em 2019 um problema que poderia levar a empresa à beira da falência no ano seguinte e não tivesse feito nada? O governo brasileiro agiu assim em relação aos alertas de que a Amazônia deverá enfrentar em 2020 uma temporada de incêndios ainda mais dantesca do que a do ano passado. Na iniciativa privada, seria caso de demissão.

A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) avalia que o poder destrutivo das chamas aliado à penetração do novo coronavírus mata adentro pode resultar numa “catástrofe”. A instituição está realizando um estudo para avaliar os efeitos que o encontro da Covid-19 com as queimadas poderá causar na saúde da população local. Em 2019, cidades de Amapá, Pará, Maranhão e Mato Grosso tiveram o maior número de casos já registrados de doenças respiratórias. Segundo dados preliminares, morar em cidades próximas a incêndios florestais aumenta em 36% a possibilidade de a pessoa ser internada. “A exposição à fumaça fragiliza o sistema imunológico, a pessoa fica mais vulnerável às infecções em geral, como a pneumonia. O sistema imunológico fragilizado e com a Covid pode ser uma catástrofe”, disse o pesquisador Christovam Barcellos, um dos coordenadores da pesquisa. Não se trata apenas (sic) do meio ambiente, são mais vidas que serão perdidas.

O inevitável fogaréu é resultado direto das sucessivas quebras de recordes de desmatamento que o país vem batendo desde o início de 2019, causadas não só pelo descaso e por uma política ambiental primitiva, como também pelo mau uso do dinheiro público. Por exemplo: enquanto gastou-se migalhas com prevenção, o Ministério da Defesa acaba de pagar mais de R$ 145 milhões, aparentemente sem licitação, num satélite para monitorar o desmatamento na Amazônia. Este trabalho já é feito, com tecnologia e know-how superiores, pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O órgão, criado em 1961, tem sido fonte constante de dor de cabeça para o governo, simplesmente por fazer o seu trabalho – assim como Ibama e ICMBio. Talvez por isso, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações tenha reduzido a zero o seu orçamento para pesquisa em 2021. Depois se o povo chamar o novo satélite de Caô I, não venham reclamar.

A salvação da Amazônia não virá do espaço, tampouco de operações pontuais com nomes escolhidos pelo pessoal do marketing. É preciso tratá-la de forma diferente. Em 2017, um incêndio monstruoso destruiu a região do Pedrógão Grande, em Portugal. Um pequeno sítio foi poupado das chamas, formando uma ilha verde cercada de cinzas e a Intervenção Divina não teve nada a ver com o ocorrido. O fogo parou nas castanheiras, nos carvalhos e nas oliveiras, árvores nativas de Portugal, que cercavam a propriedade. Elas formaram uma barreira natural, pois armazenam água no solo e têm copa volumosa, o que ajuda a baixar a temperatura substancialmente. Incêndios florestais têm sido cada vez mais comuns na Europa e pesquisadores da Universidade do Porto fizeram um estudo que defende o uso das chamadas “paisagens inteligentes” para controlar incêndios. No Brasil, temos os maiores especialistas do mundo nessa área: os povos originários.

Em 1975, quando o Inpe começou a fazer o monitoramento da ocupação da Amazônia, só 0,5% da floresta tinha sido desmatado. Em 1988, essa porcentagem subiu para 5,5% e hoje está em 20%. A história da ocupação humana na região data de 8 mil anos. Neste longo período, só uma parte ínfima da floresta foi abaixo, enquanto em pouco mais de 40 anos nós a reduzimos a 80% do seu tamanho original. A Amazônia desmatada é altamente inflamável, mas de pé é úmida, só queima se alguém tacar fogo. Incêndio na mata é crime. Os indígenas não vivem na floresta, fazem parte dela. Eles conhecem as propriedades de todas as árvores, sabem usar o manejo florestal para combater fogo. É um conhecimento milenar. No momento, a pandemia os obrigou a se recolherem, então pouco podem fazer. Mas depois que isso tudo passar, devemos ter juízo e lhes devolver a direção da Amazônia.

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