O verde e as verdinhas

O verde e as verdinhas

Caro Mercado Financeiro,

Eu, Meio Ambiente, sempre tive com você uma relação difícil. Por isso, foi com imensa alegria que recebi a última carta que Larry Fink, CEO do fundo BlackRock, enviou a seus investidores – assim como os comentários que vi no Fórum Econômico Mundial. Com a pandemia, ninguém pôde ir a Davos e as conversas tiveram de ser virtuais. Mas tudo indica que o verde vai finalmente se entender com as verdinhas. Não foi sem alguma vaidade que li Mr. Fink dizer que seus clientes perguntam sobre o risco climático todos os dias. Também fiquei lisonjeado quando o fotógrafo Sebastião Salgado falou, na abertura do Fórum, que “podemos viver em paz com o meio ambiente“. E aí, vamos ficar de bem ou seguir nos desentendendo?

Assim como você, estou muito esperançoso com o maior interesse das empresas pelo selo ESG, concedido por consultorias e outras instituições. Ter companhias preocupadas com Environment, Social e Governance (ou natureza, iniciativas sociais e governança corporativa em bom português) é a chance que eu esperava há séculos para mostrar que também tenho meu valor. O fato de as ações das firmas com este selo terem sido mais procuradas ao longo de 2020 mostra que não sou o único que pensa assim.

Como dizia o economista Milton Friedman, “não existe almoço grátis” e cuidar de mim até que é um preço justo, tendo em vista o bom retorno que proporciono. Por exemplo, a cada segundo, 33 mil litros de água são distribuídos pelo Sistema Cantareira e outros 43 mil litros são captados no Rio Guandu. Isso permite que as cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro sigam sem sede (apesar da geosmina no caso carioca). Já pensou se estes valores oscilassem como os papéis da bolsa? Este é o cenário que você evita quando me preserva.

É como se, da noite para o dia, todos descobrissem o meu potencial. Em 2020, foram investidos US$ 288 bilhões em ativos sustentáveis, o dobro do verificado no ano anterior. Um levantamento da empresa Morning Star apontou que só no primeiro semestre do ano passado, 23 fundos compostos apenas por ações de empresas ESG foram lançados nos Estados Unidos. Das 20 maiores corporações do mundo, 19 já se comprometeram a zerar suas emissões de gases de efeito estufa na atmosfera nos próximos anos. A única exceção é uma estatal de petróleo saudita. Até o bilionário Jeff Bezos, todo-poderoso da Amazon, anunciou esta semana que vai deixar o comando da varejista para poder dar mais atenção a iniciativas como o fundo Bezos Earth, que financia soluções criadas por comunidades tradicionais para preservar o meio ambiente.

Outra pesquisa, do Itaú BBA, perguntou a investidores qual das 3 letrinhas da sigla eles consideravam a mais importante. Nela, o E deu um banho no S e no G. Sou a prioridade de 90% dos estrangeiros e 50% dos brasileiros, entre os quais a moda está começando a pegar. Já tem banco com projeto de preservação da Amazônia, loja de roupa que só trabalha com algodão certificado e operadora de celular que recolhe lixo eletrônico. Tudo para ter o bendito selinho e sair bem na foto. O primeiro fundo ESG do Brasil foi criado em 31 de agosto do ano passado. Em menos de 6 meses, surgiram, pelo menos, outros seis, que já acumulam R$ 700 milhões, segundo a Anbima. Parece muito, mas é só 0,13% do dinheiro investido em fundos no país, o que mostra que ainda há espaço para crescer.

É muito bom ver tantas coisas caminhando. Mas confesso que alguns pontos ainda me preocupam. Vice-presidente do Brasil, o general Hamilton Mourão afirmou no Fórum Econômico Mundial que depende do apoio da iniciativa privada para preservar a Amazônia após a pandemia. Segundo ele, o governo não terá mais dinheiro para investir em ciência. Mas Eric Pedersen, executivo do fundo Nordea, pontuou que é importante que os Estados forneçam uma estrutura regulatória que encoraje os investimentos, por exemplo. E o governo do Brasil, no último ano, não aplicou nenhuma multa ambiental.

Já Jan Saugestad, do fundo Storebrand, lembrou que, para quem quer preservar o meio ambiente, não faz sentido investir num país onde o desmatamento cresce e nada acontece. Enquanto isso, a proposta de orçamento do governo brasileiro para fiscalização ambiental em 2021 é a menor deste século, segundo o Observatório do Clima. “Os povos indígenas desempenham um papel crucial na proteção das florestas”, afirmaram por meio de nota representantes do grupo Diálogo de Política de Investidores sobre Desmatamento. Isso logo depois de termos Bolsonaro, presidente da república, denunciado por lideranças indígenas ao Tribunal Penal Internacional por crimes ambientais. É como se o Brasil fosse um investimento de altíssimo risco e baixíssimo rendimento. Não dá mais nem para alugar, como propôs o Raul. Em relação a isso, o naturalista inglês David Attenborough disse numa entrevista recente: “Será maravilhoso quando o Brasil entender que é economicamente melhor deixar a floresta em pé do que derrubá-la”.

Se o desespero quase sempre paralisa, a esperança tem a vantagem de nos tranquilizar e, às vezes, até resultar em algo bom. E não faltam motivos para eu ter esperança. Um estudo da Ember e da Agora Energiewende mostrou que, em 2020, a Europa produziu mais energia a partir de fontes renováveis do que de combustíveis fósseis pela primeira vez. Nos Estados Unidos, Joe Biden recolocou o país no Acordo de Paris e anunciou a meta de tornar sua economia livre de carbono até 2050. Sondagens da BlackRock com investidores de 27 países indicaram que eles pretendem dobrar a fatia das ESGs em suas carteiras de investimento até 2025. Há quem diga até que, no futuro, o selo vá deixar de ser um diferencial para se tornar uma pré-condição.

Despeço-me com uma citação de Carlos Abras, coordenador de negócios e mobilização de recursos da Fundação SOS Mata Atlântica, que resume o que penso sobre o assunto: “Existe um custo ambiental para produzir nesse planeta e devolver a ele parte das receitas é uma atitude ética“.

Um abraço,
Meio Ambiente

#MeioAmbiente #Economia #ESG #Davos #Sustentabilidade #UmaGotaNoOceano #CadaGotaConta

BlackRock – Carta do Larry Fink aos CEOs

Jamil Chade (Uol) – Premiado por Davos, Sebastião Salgado defende “paz com meio ambiente”

Você S/A – A mão invisível do ESG

Sabesp – De onde vem?

Cedae – ETA Guandu

Rosana Jatobá (Uol) – No oceano de discursos virtuais de Davos, a onda verde veio com tudo

Tasso Azevedo (O Globo) – Emissão zero e o novo normal

Amazon – Email from Jeff Bezos to employees

The Soluction Project – Bezos Earth Fund

Miriam Leitão (O Globo) – Na agenda do clima, mudança de eixo nos afeta diretamente

Folha – Fundo estrangeiro rebate Mourão, vê diálogo vazio e cobra política ambiental

Uol – Ação ambiental é insatisfatória, dizem investidores após reunião com Mourão

Observatório do Clima – Fakebook.eco newsletter

Uol – Cacique Raoni denuncia Bolsonaro no Tribunal de Haia por crimes ambientais

Veja – O planeta é vulnerável, diz o naturalista David Attenborough

Folha – Biden ambiental

Nexo – O papel das empresas na preservação do meio ambiente

Hora da faxina

Hora da faxina

Já passou da hora de fazer uma faxina caprichada no Brasil, daquelas de lavar até a alma. É muita sujeira: o país produz quase 80 milhões de toneladas de lixo por ano; ficamos atrás apenas de EUA, China e Índia, e à frente de Indonésia e Paquistão, países mais populosos. Segundo um estudo da Associação Brasileira de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), de 2010 a 2019 a nossa pilha de lixo cresceu 18,8%, indo de 67 milhões de toneladas anuais para 79,6 milhões. No mesmo período, a população cresceu 8,7%, conforme estima o IBGE. Ou seja, estamos ficando mais desleixados – e olha que nessa conta ainda não entrou o caminhão da pandemia, com seus equipamentos de segurança descartáveis, sacolas de entrega em domicílio etc.

Pior que a gente não só suja, como não limpa direito. Desserviço completo. O lixo jogado fora de forma inadequada aumentou de 25 para 29 milhões de toneladas por ano. “Temos no país uma deficiência na coleta. Cerca de 6 milhões de toneladas sequer são coletadas”, diz Carlos Silva Filho, diretor-presidente da Abrelpe. E somente 4% do lixo recolhido é reaproveitado; o resto penetra no solo, contaminando lençóis freáticos; vira poeira tóxica ou gás do efeito estufa – contribuindo com as mudanças climáticas –; ou chega ao oceano. Além disso, afeta diretamente a saúde de quem vive perto dessa herança medieval: “A gente sabe que resíduo descartado de forma inadequada é um criador propício para vetores de várias doenças. Embalagens que acumulam água são criadoras de mosquito da dengue, entulho é criador para rato, cobra, escorpião”, explica Ronan Cleber Contrera, professor da Escola Politécnica da USP.

A Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), instituída em 2010, previa a erradicação dos lixões a céu aberto em todos o território nacional até 2014. Bom, isso não só ainda não aconteceu como a aprovação do novo marco do saneamento básico, em julho de 2020, postergou ainda mais este prazo: capitais e regiões metropolitanas têm até o próximo dia 2 de agosto para acabar com os lixões, enquanto cidades com mais de 100 mil moradores têm até agosto do ano que vem; as menores podem esperar até 2024. Haja barriga para empurrar tanto entulho. Cerca 3.000 dos 5.570 municípios brasileiros ainda mantêm lixões a céu aberto, segundo a Abrelpe.

As alternativas já existem e estão disponíveis. O lixo pode ser acomodado em aterros sanitários, por exemplo, menos poluentes e mais seguros. Mas o ideal é não desperdiçar, ou reaproveitar. Detritos orgânicos podem virar adubo natural em usinas de compostagem ou servirem como matéria-prima para a produção de biogás. Hoje, a produção nacional é de 1,5 bilhão de metros cúbicos por ano. Isso dá menos de 4% da produção de combustíveis fósseis, mas a Associação Brasileira do Biogás (Abiogás) estima que o nosso potencial é de 40 bilhões de metros cúbicos por ano.

Além de fazerem mal ao meio ambiente, os lixões ainda concentram uma grave questão social. Em dezembro, Pedro Guimarães, presidente da Caixa, ficou boquiaberto ao descobrir que havia pessoas vivendo neles: “Há três semanas, visitamos alguns lixões. E o que a gente viu é algo que eu nunca tinha pensado que existisse. Pessoas morando nos lixões e vivendo no chorume”, disse ele. Milhares de brasileiros ainda sobrevivem nessas condições sub-humanas – embora permaneçam invisíveis.

Será que Guimarães não assistiu à novela “Avenida Brasil”, com a memorável Mãe Lucinda? Mas, como essas histórias estão longe de serem ficção, recomendamos o premiado documentário “Estamira” (2004), de Marcos Prado, como ponto de partida. Ele conta a história de uma senhora que vivia no extinto Lixão de Gramacho, no Rio de Janeiro. É um grito de socorro. Gramacho foi fechado oficialmente em 2012 e era o maior lixão da América Latina. Centenas de famílias dependiam dele para sua subsistência. Outro filme brasileiro sobre este lugar é “Lixo extraordinário” (2011), que foca na relação do artista visual brasileiro Vik Muniz com catadores de lá. Além de documentar essa parceria, o documentário registra a união desses trabalhadores em sua busca por alternativas de trabalho. Afinal, o que é lixo para uns pode valer ouro para outros.

O Brasil reciclou apenas 3,7% da sujeira que produziu em 2019, segundo o Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana (Islu), e a Abrelpe alerta que perdemos R$ 14 bilhões por ano por causa disso. Nem parece o mesmo país que reaproveita 97,6% das latinhas que consome de cerveja e refrigerante, liderando o ranking mundial na modalidade. Nem o coronavírus segurou nossos bravos catadores: de acordo com a Associação Brasileira do Alumínio (Abal) e a Associação Brasileira dos Fabricantes de Latas (Abralatas), foram coletadas 45 mil toneladas a mais do que em 2018, um aumento de 14,7%. Como diz a frase grafitada pelo artista visual Mundano nos carrinhos da galera de São Paulo, “Um catador faz mais do que um ministro do Meio Ambiente”.

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A Era de Aquário está dentro de nós

A Era de Aquário está dentro de nós

Dizem que o astrônomo maia trocou as bolas na hora de escrever a data do Juízo Final e, em vez de 2021, anotou 2012 no famoso calendário. Fato ou fake, a história rendeu um bom meme na internet e realmente 2020 nos deixou com um pezão atrás em relação ao futuro. Por outro lado, Júpiter e Saturno se alinharam em 21 de dezembro. O fenômeno conhecido como Estrela de Belém brilhou de novo no céu e, para muita gente, marcou o início da Era de Aquário. Um tempo no qual “a paz guiará os planetas e o amor comandará as estrelas”, como diz aquela música do “Hair”. A esta altura do campeonato, uma mudança que cairia bem para o nosso surrado planetinha. Resta saber se ela virá das estrelas ou partirá de nós mesmos.

Cada era astrológica dura mais de 2000 anos. Há quem acredite que, tecnicamente, ainda estamos na Era de Peixes, que antecede Aquário. Astrologia é interpretação; por isso, não existe consenso. Para alguns, a Era de Aquário começou em 2000. Para outros, só vai dar as caras em 2600 e há quem diga que somente no ano 3000. O florescer das religiões, as guerras por conta de ideologias e a dedicação dos homens a ideais que nunca se tornaram realidade foram algumas das marcas da Era de Peixes. Já para Era de Aquário, as expectativas são bem mais animadoras.

Espera-se que seja um tempo em que a humanidade reformule a vida em sociedade e o entendimento entre os indivíduos. Movimentos sociais ganharão relevância; o consumo consciente, novos adeptos. A intuição cederá espaço a um ser humano mais lógico e racional. Se tudo isso se cumprir nos próximos tempos, a Era de Aquário terá saído melhor do que encomenda. Imagine um mundo em que indígenas e quilombolas são reconhecidos e respeitados, em que ninguém compra mais do que precisa e que aproveitamento e preservação da natureza são apenas dois lados de uma mesma moeda. Tudo isso se encaixa na descrição acima, o que nos faz querer que esta tal era comece o quanto antes.

“Harmonia e entendimento, solidariedade e abundante confiança, nada mais de falsidade ou menosprezos”, cantavam os cabeludões de “Hair”. Sejamos sinceros: para alcançar estes objetivos, dependemos menos dos astros do que de nós mesmos. A capacidade que tivemos de colocar o planeta na atual embrulhada é equivalente ao nosso potencial de criarmos um outro tempo guiado por novos valores. Se a era vai ser de Peixes ou de Aquário, tanto faz. O importante é que seja diferente. E essa mudança precisa partir de nós.

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Armínio Fraga: a social economia

Quais são os caminhos para uma economia mais democrática? Nosso conselheiro Miguel Pinto Guimarães conversa sobre os possíveis rumos com o economista Armínio Fraga. Uma conversa para discutir os rumos para uma sociedade mais justa e o papel do terceiro setor na falta de ações do Estado também pautam a conversa. Em um momento de crise econômica e sanitária, somada a atmosfera de polarização exacerbada, e os diálogos sobre possíveis rumos para o Brasil é fundamental para reaver a esperança em um país melhor. #CadaGotaConta!

#ArmínioFraga #EconomiaSocial

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Conta gota: Marina Silva

Conta gota: Marina Silva

Para a ex-ministra do Meio Ambiente e ex-senadora Marina Silva, sustentabilidade não deve ser encarada apenas uma maneira da produzir, mas como “uma visão de mundo, um ideal de vida”. Em conversa via internet com o arquiteto, urbanista e conselheiro de Uma Gota no Oceano Miguel Pinto Guimarães, ela propôs que um modelo de desenvolvimento que considera os pontos de vista econômico, social, ambiental, cultural, político, ético e até mesmo estético. “É preciso pensar o mundo não a partir do ideal do ter, mas do ideal do ser. Há limites para ter, mas não há para ser. O planeta nos limita, os recursos são finitos. Por outro lado, não há limites para pintar o melhor quadro, fazer a melhor poesia, compor a melhor música. No ideal do ser, a gente não está disputando coisas, está agregando mais valores simbólicos, estéticos, afetivos”. Este foi um dos temas da primeira live, realizada na última quinta-feira (dia 15), coproduzida por Uma Gota no Oceano.

“Nós já tivemos debates entre o capitalismo, o socialismo, o liberalismo. Todo mundo gosta de um ismo. Talvez a gente tenha que trabalhar na dimensão do sustentabilismo”, provocou Marina. Verdade seja dita: a expressão sustentabilidade foi banalizada a ponto de virar peça de propaganda, como lembrou Miguel, ou “vaidade pessoal”, como costuma dizer o pensador Ailton Krenak. Mas evidentemente não se trata apenas de uma questão de sufixo, mas de fazer mudanças radicais que garantam um futuro melhor para todos. O mundo pós-pandemia de coronavírus não será o mesmo e a própria Covid-19 é uma prova de que não vínhamos fazendo as melhores escolhas. “Em vez de querer a herança, temos que trabalhar pelo legado”, afirmou.

Marina sabe, por experiência própria, que a mudança está ao alcance de nossas mãos. Quando esteve no Ministério do Meio Ambiente ela coordenou a criação do Plano de Prevenção e Controle de Desmatamento da Amazônia. A situação estava fora de controle: 27 mil km² de floresta tinham ido abaixo em 2004. O plano reduziu a devastação em mais de 83% em 10 anos, evitando que fossem lançados na atmosfera mais de 4 bilhões de toneladas de CO₂. Marina adotou uma política transversal, na qual a agenda ambiental não era exclusividade do Ministério do Meio Ambiente: “Para o desmatamento cair naquela época foi preciso um conjunto de ações que envolveu 13 ministérios com a participação de diferentes setores da sociedade, da academia a movimentos sociais”, lembrou. Em tempos de Medida Provisória 910 – que legaliza terras invadidas na Amazônia – é oportuno lembrar que durante a sua passagem pela pasta foram inibidas 60 mil tentativas de grilagem. “Hoje existe, de forma induzida, uma indústria de invasão”, disse ela.

Desde sua saída do ministério essas políticas vêm sendo enfraquecidas, mas a partir deste governo isso vem sendo feito de modo avassalador – por ação ou omissão. “O ministro do Meio Ambiente vem operando sistematicamente para destruir a governança ambiental brasileira. Ele acha que está favorecendo as empresas e o agronegócio, mas está criando graves prejuízos”, afirmou Marina. O último foi a decisão do Banco Central da Noruega, anunciada na última quarta-feira (13/5), de excluir a mineradora Vale e a estatal de energia Eletrobras do maior fundo soberano do mundo, que administra uma reserva de mais de US$ 1 trilhão a partir de lucros gerados pelo petróleo. Os motivos? Danos ambientais e violações de direitos humanos. “Economia não precisa ser separada de ecologia. O mundo inteiro está discutindo durante a crise como migrar para o desenvolvimento sustentável com os investimentos que serão necessários para reerguer a economia no pós-pandemia. No Brasil estamos fazendo o oposto”. O país não tem se esforçado para cumprir suas metas do Acordo de Paris, por isso, e não deverá ser tratado com condescendência: “Os países que estão se sacrificando para cumprir suas partes no tratado não vão permitir que o Brasil lucre em prejuízo do clima, do meio ambiente e dos direitos dos povos originários”.

Marina lembrou como opção o Programa Amazônia 4.0, lançado pelo cientista Carlos Nobre, cuja ideia é unir o conhecimento ancestral dos povos tradicionais às novas tecnologias para criar produtos e materiais a partir da biodiversidade de floresta, como forma de atingir essas metas. A palavra mágica se chama bioeconomia “Nós temos uma commoditie que já é mais rentável do que o café, que é o açaí. Só não há escala de produção para atender à demanda, que ainda pode ser estimulada. Então é preciso associar biodiversidade, agroindústria, bioindústria, sistemas agroflorestais e comunidades locais. para que possamos vender produtos acabados e não matéria-prima”. A ex-ministra disse ainda que a Covid-19 nos deixou uma importante lição: “Com essa visão de terceirizar processos de produção com visão exclusiva do lucro, o mundo ficou refém da China em relação quando precisou de produtos como respiradores e máscaras”.

Marina lembrou, porém, que a maior riqueza que a Amazônia nos dá são os serviços ambientais que ela presta não só ao Brasil, como ao planeta. “Nós só somos uma potência agrícola porque somos uma potência florestal e hídrica. E só somos uma potência hídrica por causa da Amazônia. Ela produz 20 bilhões de toneladas de água por dia, que são lançados na atmosfera na forma de vapor d’água e viram chuva nas regiões mais economicamente importantes do país”. Para gerar a energia que bombear essa água, que é levada naturalmente do norte para o sul, o sudeste e o centro-oeste do país, nós precisaríamos de 50 mil Usinas de Itaipu. Marina lembrou ainda que a importância da Amazônia para o mundo é tão grande que ela ainda ajuda a regular a salinidade das águas do oceano, já que em torno de 17% da água doce que chega ao oceano vem das chuvas e da água produzidas na região.

Miguel lembrou que em sua última campanha para a Presidência, Marina usou como slogan uma frase de Raul Seixas: “Sonho que se sonha só é só um sonho que se sonha só. Mas sonho que se sonha junto é realidade”. Hoje ela tem um sonho que gostaria de dividir com todos: “Sonhar juntos não significa eliminar as diferenças, criar um processo de homogenização, só existe troca na diferença. Mas que é possível construir um país que seja ao mesmo tempo economicamente próspero, socialmente justo, politicamente democrático, ambientalmente sustentável e culturalmente diverso. Este é um sonho bom para quem crê e para quem não crê”.

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