Funai perde atribuições fundamentais

Funai perde atribuições fundamentais

A notícia parece preocupante e é mesmo. O novo governo baixou uma Medida Provisória que destitui a Fundação Nacional do Índio (Funai) de identificar, delimitar e demarcar Terras Indígenas (TIs). As atribuições, fundamentais à questão indígena, caberão ao Ministério da Agricultura, cuja titular da pasta, Teresa Cristina, é deputada licenciada da bancada ruralista.

A identificação e demarcação de territórios quilombolas, até então a cargo do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), também ficarão sob a tutela da Agricultura. Tão importantes na formação do Brasil, os povos indígenas e quilombolas precisam cada vez mais de respeito e reconhecimento do país que ajudaram a construir.

Via Folha de S.Paulo

Foto: Mauricio Hashizume

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Brasil à venda para estrangeiros

Brasil à venda para estrangeiros

O governo pretende tirar em breve do forno seus planos para facilitar a venda de terras no Brasil a estrangeiros. Aguardada com ansiedade por alguns membros da bancada ruralista, a mudança poderia reduzir o espaço para a demarcação de Terras Indígenas e a agricultura familiar, que produz hoje mais de 70% dos alimentos consumidos no país.

Há ainda um outro efeito colateral em jogo: a expansão da soja e da cana provocada pelo interesse estrangeiro no mercado global empurraria a pecuária ainda mais para a Amazônia, agravando a onda de desmatamento já em curso.

Será que vamos, mais uma vez, andar na contramão do clima?

Via: BBC Brasil

Foto: Adriano Gambarini/WWF Brasil

Saiba mais: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-39214595

Um ano de extremos

Um ano de extremos

Instabilidade e variações ao longo do período. Pelo lado positivo: 2017 foi o ano em que barramos a liberação da Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca), uma enorme área na Amazônia, para a exploração mineral, mostrando que, unidos, somos fortes. Se houve retrocessos socioambientais no país, diante da avalanche de leis semeada pela bancada ruralista no Congresso, o estrago foi até pequeno – pois em grande parte, as votações ficaram para 2018. Estrago real e muito maior quem mostrou, de fato, foi a natureza, revoltada com nosso descaso: este foi um ano de recordes de queimadas e de estiagem, que quase secou o maior reservatório de água do Brasil. Motivos para nos mobilizarmos em 2018 não faltam.

A crise política aumentou o poder da bancada ruralista que usou seus 240 votos na Câmara para dar apoio a projetos e garantir a cadeira do presidente da República, recebendo em troca uma série de “agrados” e reivindicações atendidas. Do perdão para dívidas à redução de contribuições fiscais e à anistia para grileiros, passando pelo loteamento de cargos e o esvaziamento de órgãos governamentais “incômodos”, como a Funai e o Ibama. E, também, uma série de alterações na legislação à sua feição que, entre outras coisas, liberam agrotóxicos banidos no Primeiro Mundo, enfraquecem o licenciamento ambiental e a fiscalização, dificultam o reconhecimento e a demarcação de terras indígenas e quilombolas e reduzem as áreas protegidas de florestas. Dentro de uma estratégia coordenada, Executivo e Legislativo lançaram ao longo do ano uma coleção de Medidas Provisórias (MPs), Projetos de Emendas Constitucionais (PECs) e Projetos de Lei (PLs) que tratavam das mesmas matérias, sucessivamente, até que um deles fosse aprovado em votações que, muitas vezes aconteciam na calada da noite.

Do Palácio do Planalto vieram Medidas Provisórias como as MPs 756/2016 e 758/2016, que se aprovadas acabariam de uma vez com mais de 1,1 milhão de hectares de áreas de proteção e Unidades de Conservação das florestas brasileiras, como a Floresta Nacional do Jamanxim, no Pará, que teria 37% de sua extensão liberados para exploração por mineradoras e pecuaristas. Somadas, nada menos que 10% de todas as terras protegidas do país (cerca de 80 mil km2, ou uma Áustria) estiveram – e boa parte ainda está – em risco.

Felizmente, boa parte desse verdadeiro bombardeio legislativo acabou sendo desarmado ou, pelo menos por enquanto, mantido no ar. O contra-ataque veio com contestações legais (várias das “bombas” são simplesmente inconstitucionais e foram denunciadas pelo Ministério Público), emendas e adiamentos. Tudo sob forte influência e pressão do movimento de resistência integrado por organizações e entidades ambientalistas, indígenas, de direitos humanos, do campo e da mobilização da opinião pública.

Foi esse conjunto de vozes, com grande repercussão no exterior, que fez, por exemplo, com que o presidente da república recusasse na liberação para a exploração mineral da Renca. E, na mesma região, que a licença ambiental para a instalação da mineradora predadora Belo Sun fosse cancelada – pelo menos até que, cumprindo procedimentos legais, a população tradicional diretamente afetada pelo empreendimento seja ouvida e levada em conta.

A grande visibilidade dada a essas e outras ameaças e retrocessos repercutiu no exterior. Na Noruega, o presidente Temer enfrentou protestos e recebe um pito da primeira ministra e a bagagem de volta recebeu um corte considerável nos repasses feitos pelo país nórdico para o Fundo Amazônia. E, especialmente durante o período da COP-23 de Bonn, nosso país foi muito criticado pelo papel “o que eu faço não é bem o que eu digo” que anda representando no campo socioambiental. Além do aumento do desmatamento e do desrespeito aos direitos das comunidades tradicionais, a edição da MP do Trilhão – que dá para petroleiras incentivos e isenções trilionárias –, que torna o cumprimento das metas brasileiras de emissões no Acordo de Paris virtualmente impossível. Descobrimos ainda que somos a única grande economia do mundo que aumentou expressivamente suas emissões de gases do efeito estufa sem obter nenhum crescimento econômico.

Batalhas importantes aconteceram também no STF, onde foram barradas as tentativas de legalizar o arrendamento de terras indígenas na amazônia e a diminuição de limites de parques nacionais. O julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade contra o Decreto de Titulação Quilombola, que coloca em xeque os direitos dessas comunidades, porém, foi duas vezes adiado e, agora, está marcado para fevereiro próximo. De praticamente desconhecida da grande maioria da população, depois da mobilização e de campanhas por seus direitos, a luta dos quilombolas ganhou destaque, conseguindo mais de 100 mil adesões.

No bojo dessa ação, entretanto, já houve uma definição preocupante: o princípio do marco temporal, tese defendida pelo governo e que condiciona o reconhecimento ao direito pela terra a grupos quilombolas que comprovem a ocupação das áreas reivindicadas na data de promulgação da Constituição de 1988, já foi apreciado e reconhecido, deixando sem garantias aqueles que tenham sido expulsos antes dessa data. Um princípio que ameaça – e por isso, também, une em uma mesma luta – quilombolas e indígenas.

Alheia às decisões políticas ou jurídicas, a natureza impôs duras penas ao país. O ano de 2017 foi o que mais registrou queimadas desde 1998, quando o monitoramento por satélites começou a funcionar. Foram 273 mil focos de calor, incluídos aí os 65 mil hectares do Parque Nacional Chapada dos Veadeiros, destruídos este ano no maior incêndio de sua história, com fortes indícios de ter sido criminoso. O fogo foi favorecido pela seca de uma crise hídrica tão violenta que deixou o maior reservatório de água do país, Serra da Mesa (GO) com menos de 8% de sua capacidade. A natureza do Brasil, no entanto, deu grande demonstração de sua abundância no relatório divulgado, também este ano pelo WWF-Brasil e pelo Instituto Mamirauá, apresentando ao mundo nada menos que mais 381 espécies, entre plantas, peixes, anfíbios, répteis e mamíferos. E isso somente na Amazônia.

Se podemos tirar uma lição e, com ela, um alento para as dificuldades que certamente continuaremos a enfrentar em 2018, é que em poucos momentos da história de nosso país a força da opinião pública e do engajamento dos movimentos socioambientais foi tão importante quanto neste período em que vivemos. Foi sua pressão que, a despeito do peso da bancada ruralista e de poderosos lobbies, como o da mineração, fez com que o governo, no mínimo, desacelerasse suas ações de mudança e de revisão de direitos. Isso nos garantiu mais tempo para que possamos agir. Em 2018, talvez mais do que nunca, nossa mobilização será fundamental para o futuro do país.

 

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Máquina ruralista é movida a PLs

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A máquina ruralista é movida a Projetos de Lei. Com a potência de 25 PLs, ela avança vorazmente sobre as terras indígenas e quilombolas. São 25 ameaças tramitando no Congresso. E não são apenas os povos tradicionais que têm a perder com o seu avanço: a continuar neste ritmo, o desflorestamento pode aumentar em até 90% as emissões de carbono na Amazônia nos próximos 50 anos. Não à toa, relatores da ONU criticaram as propostas ambientais de nossos parlamentares em carta confidencial: “Ela reduziria de forma substancial as proteções em vigor para povos indígenas, pessoas de descendência africana e o meio ambiente”, escreveram John Knox, Michel Forst e Victoria Lucia Tauli-Corpuz.

Muitos desses textos são estrategicamente parecidos, para a coisa funcionar como numa linha de montagem: se um não passa, vem logo outro atrás para substituí-lo. A bancada ruralista ocupa cerca de 40% das cadeiras do Congresso Nacional e esses PLs orbitam as maiores ameaças ao meio ambiente e aos direitos dos povos tradicionais. Como o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 257/2004, do ex-deputado Carlos Souza (PL-AM), que propõe incluir as Assembleias Legislativas no processo de demarcação de terras. O texto é um apêndice da famigerada PEC 215, que transfere do Executivo para o Legislativo o poder de demarcar Territórios Indígenas (TIs). A maioria deles é assinada por parlamentares ou ex-parlamentares envolvidos com a Justiça. Souza, por exemplo, é réu num processo do Ministério Público do Amazonas, que investiga o envolvimento dele e de familiares com o tráfico de drogas.

O deputado Edio Lopes (PMDB-RR) é autor do PL 1003/2015, que visa desocupar terras homologadas somente depois do pagamento de indenização aos fazendeiros, responde a processo na Segunda Turma do STF por peculato. O próprio autor da PEC 215, o ex-deputado Almir Sá (PL-RR), foi denunciado pela Procuradoria da República na 1ª Região, em Brasília, no caso que ficou conhecido como a “farra das passagens”. Ele e mais oito ex-deputados de Roraima são acusados de uso indevido de passagens aéreas quando exerciam mandato.

A famigerada tese do “marco temporal” tem três PLs no Congresso em defesa de sua adoção como instrumento para demarcação de terras. O 490/2007 é de autoria do ex-deputado Homero Pereira, que morreu em 2013. Ex-presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), ele foi também foi relator da proposta que alterou o Código Florestal e dá nome a um prêmio oferecido pelos ruralistas na Câmara.

Mas a máquina ruralista também é movida a empurrõezinhos do governo. Ela foi decisiva para derrubar a investigação contra o presidente, por corrupção passiva, no Congresso: nada menos do que metade dos votos que salvaram Temer saiu da FPA. Em troca, encontra terreno fértil e mais combustível para semear seus projetos – na forma de Decretos, Medidas Provisórias, mais verba e perdão de dívidas. Por causa disso, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) entrou com um pedido de investigação na Procuradoria-Geral da República, acusando Temer de usar a máquina pública para atacar os direitos dos povos tradicionais e se manter na Presidência. Os povos tradicionais resistem há 517 anos contra todo tipo de arbitrariedade, às vezes usando as próprias armas do inimigo. Mais uma lição que podemos aprender com eles. 

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Mineração também assombra o Jamanxim

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Não é só na região da Reserva Nacional de Cobre e Associados (Renca), entre Pará e Amapá, que áreas protegidas estão sob ataque para beneficiar a mineração. A Floresta Nacional (Flona) do Jamanxim, no sudoeste do Pará, também está na mira.

Depois de o governo apresentar ao Congresso, em caráter de urgência, o Projeto de Lei (PL) 8.107 para reduzir a proteção no Jamanxim, deputados ruralistas propuseram 12 emendas, ampliando a área afetada e tornando a proposta ainda pior: cerca de um milhão de hectares de áreas protegidas pode ser perdido – quase duas vezes o território do Distrito Federal. E quem serão os beneficiários? Invasores de terras públicas, desmatadores, madeireiros ilegais, garimpeiros e mineradoras.

As informações constam de nota técnica assinada por 11 redes e organizações ambientalistas: Grupo de Trabalho pelo Desmatamento Zero, Coalizão Pró-UC, Greenpeace Brasil, Instituto Centro de Vida (ICV), Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), Instituto Socioambiental (ISA), Rede Pró-UCs, The Nature Conservancy (TNC) Brasil e WWF-Brasil.

O texto original do PL pretendia reduzir a Flona do Jamanxim em 354 mil hectares, mas as emendas retalham mais três Unidades de Conservação. Na Flona do Jamanxim, dentro da área que se pretende transformar em APA – categoria de Unidade de Conservação que pode abrigar propriedades privadas e atividades agropecuárias – há 125 processos minerários. A parte da Flona de Itaituba II a ser transformada na APA Trairão contém 27 processos minerários, abrangendo 137.516 hectares ou 90% de sua área. A parte do Parna do Jamanxim a ser transformada na APA Rio Branco (101.270 hectares) apresenta cobertura florestal extremamente preservada (99%), mas sofre com atividade garimpeira ilegal. Entre os minérios mais procurados, estão o ouro e diamante.

Mais desmatamento e grilagem

De acordo com as organizações, se o PL for aprovado, o desmatamento na região alcançaria aproximadamente 202 mil hectares de floresta até 2030. Isso representaria uma emissão de aproximadamente 70 milhões de toneladas de gás carbônico. O Brasil estaria, literalmente, queimando US$ 350 milhões, tomando-se o valor de US$ 5 por tonelada de carbono que o Fundo Amazônia adota.

A justificativa do governo de que a redução da área atenderia a pequenos produtores rurais tampouco se sustenta. Na Flona Jamanxim, o tamanho médio das áreas requeridas para a regularização é de 1.700 hectares, ou seja, quase 23 vezes o que seria um lote de 75 hectares que caracteriza uma propriedade da agricultura familiar naquela região. Conforme a nota, as emendas ao PL representariam, ainda, um subsídio de pelo menos R$ 1,4 bilhão a grileiros, que poderiam regularizar áreas ilegalmente ocupadas por valores até 90% menores que os praticados no mercado.

Medidas Provisórias

Desde o final de 2016 Michel Temer vem tentando reduzir a Flona do Jamanxim, inicialmente através de Medida Provisória (MPs 756 e 758) e agora por projeto de lei. A novela das MPs, lançadas e vetadas por Temer, chegou a um final: na noite desta quarta-feira (31), o Congresso manteve o veto às medidas.

Foto: Greenpeace/Daniel Beltra

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E baixe o PDF com a nota técnica.

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