2025: o ano das oportunidades dentro de casa

2025: o ano das oportunidades dentro de casa

Amigas e amigos da Uma Gota no Oceano,

Chegamos ao final de 2024. Foi um ano desafiador. Sentimos os efeitos da seca mais severa da história. A área queimada no Brasil quase dobrou em relação a 2023, com um território equivalente ao estado do Rio Grande do Sul consumido pelo fogo: 29,7 milhões de hectares.

Além disso, enfrentamos enchentes devastadoras que afetaram milhares de famílias e comunidades em várias regiões do país. As chuvas intensas causaram deslizamentos de terra, destruíram casas e deixaram muitos desabrigados. A resposta a essas tragédias mostrou a força e a solidariedade do nosso povo, mas também destacou a necessidade urgente de políticas públicas para adaptação à nova realidade climática e para prevenção e mitigação de desastres naturais.

E em meio a tudo isso, nossos parlamentares, mais uma vez, demonstraram indiferença aos brasileiros e aos interesses do bem comum. Os direitos dos povos tradicionais, por exemplo, foram usados como moeda de troca nas negociações entre o Congresso e o Supremo Tribunal Federal, numa pauta que rasga a Constituição Federal, o marco temporal.

Nossa caminhada ao lado dos nossos parceiros indígenas e quilombolas nos ensinou a olhar para o futuro e celebrar as pequenas e grandes conquistas. Este ano marca um capítulo importante dessa caminhada: muitas comunidades tradicionais estão prestes a celebrar as festas de fim de ano em casa, após décadas aguardando pelo reconhecimento de seus territórios.

Em 2024, celebramos uma conquista que reflete um pouco da nossa jornada, com a assinatura da portaria declaratória da Terra Indígena Sawré Muybu, no Pará. Uma luta do povo Munduruku que acompanhamos há 10 anos e que representa um marco para o fortalecimento dos direitos dos povos indígenas.

As comunidades quilombolas também conquistaram mais de 20 títulos de domínio de território, embora muitos ainda sejam parciais. E, em decisão inédita na COP16 da Biodiversidade, na Colômbia, celebraram o reconhecimento dos povos afrodescendentes nos documentos oficiais da Convenção.

Além de ter criado o Ministério dos Povos Indígenas, o atual governo se propõe a ser reconhecido na história como o que mais demarcou terras indígenas, superando dois ex-presidentes: Fernando Collor, com 110 homologações, e Fernando Henrique, que encerrou a gestão com 143 territórios homologados.

Uma meta passível de ser alcançada. Nos dois mandatos anteriores, foram 86 terras homologadas, mais 13 do atual mandato, somando 99 homologações. Considerando somente os 68 processos que requerem portarias ministeriais, os resultados podem ser atingidos, com avanços significativos na política de regularização fundiária.

Mas essa marca na história exige que se cumpra a Constituição Federal. O marco temporal ou outras denominações e artimanhas para restringir as demarcações, como “conciliação”, precisam ser enfrentadas e exterminadas. A demarcação dos territórios tradicionais não é um favor, é uma determinação constitucional e compete ao presidente da República fazer valer a Carta Magna.

Pela demarcação e contra o Marco Temporal, seguimos firmes!

O ano de 2025 trará uma oportunidade única: os debates sobre políticas climáticas mundiais acontecerão aqui, na nossa casa. A cidade de Belém, no Pará, será a anfitriã da COP 30, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima. O Brasil tem a chance de brilhar na agenda do clima e na capacidade diplomática.

Que a COP 30 seja um palco onde a contribuição dos guardiões da Terra seja reconhecida e celebrada!

E que 2025 seja o ano em que as vozes dos povos tradicionais da Amazônia, da Caatinga, do Cerrado, da Mata Atlântica, do Pantanal e do Pampa ecoem pelo mundo em defesa do planeta!

A você, que caminha conosco, enviamos um oceano de saudações de alegria, paz, saúde e esperança para este ano que se inicia! Boas Festas!

Com carinho e gratidão,

A equipe da Uma Gota no Oceano

A floresta no limite

A floresta no limite

Após os resultados insatisfatórios da COP 29, principalmente em termos de financiamento climático, os olhos do mundo já se voltam para o Brasil, que sediará a COP 30 em 2025, em plena Amazônia, em Belém do Pará. A próxima Conferência do Clima recebe como herança uma responsabilidade ainda maior de pressionar os países para atingirem metas de financiamento mais condizentes com a realidade da emergência climática que o mundo enfrenta. Até lá, é importante que o país trabalhe para fortalecer suas próprias iniciativas de adaptação, mitigação climática e transição energética, principalmente na Amazônia, a maior floresta tropical do mundo, que já se encontra num limite perigoso para sua sobrevivência e a dos povos que a habitam.

Ainda durante a COP, foi justamente este o tema da mesa apresentada pela Gota e seus parceiros, com a participação de lideranças indígenas e cientistas. Com o título de “Infraestrutura sustentável na Amazônia: caminhos para a transição energética e ecológica”, o painel contou com a presença de Alessandra Munduruku (na foto), presidente da Associação Indígena Pariri; Sineia do Vale, liderança do povo Wapichana, de Roraima, e co-presidente do Caucus Indígena na COP; a cientista Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM; o gerente de projetos do IEMA, Ricardo Baitelo; e Cleidiane Vieira, representando a Coordenação Nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

O debate girou em torno da necessidade de se estabelecer uma infraestrutura que seja sustentável para a Amazônia, incluindo sempre a perspectiva dos povos locais e já considerando a adaptação aos graves efeitos da crise climática. Por dois anos seguidos, 2023 e 2024, a região amazônica viveu uma crise humanitária, hídrica e de logística causada pela seca extrema dos rios, o calor intenso e o aumento das queimadas. O receio é que a floresta atinja um ponto irreversível de destruição e não consiga mais se recuperar.

“Precisamos realmente começar a nos planejar para enfrentar diretamente a mudança climática. Nós (povos indígenas) somos parte dessa solução, mas se esta variação no clima continuar ocorrendo, sabemos que não temos o poder de fazer o rio se encher novamente de água”, ressaltou Sinéia do Vale, que também atua como coordenadora do Comitê Indígena das Mudanças Climáticas (CIMC) no Brasil.

A cientista Ane Alencar apresentou dados alarmantes sobre os incêndios registrados no Brasil neste ano: de 27 milhões de hectares queimados de janeiro a outubro, 55% foram só na Amazônia. Segundo Ane, especialista em estudos sobre fogo, a infraestrutura disponível para o uso do solo pela agricultura no país precisa levar em conta que o clima já mudou e a temperatura na Terra não é mesma.

Outro tema abordado durante a mesa foram as consequências da instalação de usinas hidrelétricas na Amazônia, com inúmeros impactos de violação de direitos e exclusão social, beneficiando pouco quem vive na região e desconsiderando as mudanças climáticas. Segundo Ricardo Baitelo, a melhor infraestrutura de energia para a região não tem a ver com a geração e distribuição nos moldes atuais. O investimento em energia solar e eólica, segundo ele, é uma boa alternativa que vem ocorrendo no Brasil, principalmente para melhorar os índices socioeconômicos no Norte do país e democratizar o acesso à saúde educação.

“As hidrelétricas foram feitas para atender a demanda de geração de energia do país, nunca para atender a demanda dos povos”, completou Cleidiane Vieira.

Além das hidrelétricas, a construção de ferrovias e estradas, mineração, expansão de hidrovias e portos, exploração de gás e monopólios da agropecuária previstos para a região amazônica são vistos como sérias ameaças à floresta e seus habitantes, já que passam por cima dos direitos e das terras dos povos tradicionais.

Lembrando que esses povos precisam ser consultados em qualquer projeto para a região, Alessandra Munduruku foi enfática: “A gente não precisa da riqueza da mineração, de crédito de carbono, mas sim da riqueza do conhecimento, do rio limpo, da floresta em pé”, disse ela, criticando especificamente a ferrovia Ferrogrão, projetada pelo governo federal para rasgar quase mil quilômetros de floresta amazônica entre Sinop, de Mato Grosso, e Miritituba, no Pará – atingindo unidades de conservação e terras indígenas para escoar milho e soja do agronegócio do Centro-Oeste até as saídas portuárias pelo Rio Amazonas rumo ao Atlântico.

Os impactos da ferrovia devem atingir em cheio as terras do povo Munduruku situadas no Médio Rio Tapajós, já prejudicadas por hidrovia, portos, invasão de territórios e garimpo ilegal. “Não adianta o governo falar sobre mudanças climáticas e liberar mineração e a Ferrogrão. Só no Rio Tapajós há 41 portos planejados e 27 já em operação. Vários rios e igarapés estão sendo destruídos para tirar ouro. Não comemos ouro, comemos peixe, raízes, frutos”, criticou Alessandra, finalizando: “Não tem planeta dois”.

Brasil precisa liderar acordo global sobre metano

Brasil precisa liderar acordo global sobre metano

O país pode mostrar ao mundo como desacelerar o aquecimento nesta década, puxando o freio de emergência

Por Durwood Zaelke*

O Brasil está numa encruzilhada crítica: com seu tamanho, posição geográfica, biodiversidade e reservas de água doce, pode liderar a nova economia verde de que o mundo precisa com urgência. Mas o tempo é limitado, e há muito a fazer.

A eleição de Donald Trump nos Estados Unidos representa um desafio adicional. Conhecido por sua flexibilização regulatória e apoio ao setor de combustíveis fósseis, Trump prometeu linha dura em relação às restrições ambientais e sinalizou o retorno às políticas que priorizam os combustíveis fósseis, com seu slogan de campanha, drill, baby, drill (perfure, querido, perfure). Como os Estados Unidos são a maior economia do mundo e o segundo maior emissor de gases de efeito estufa, suas decisões terão impacto direto na luta global contra as mudanças climáticas.

Como alertou o secretário-geral da ONU, António Guterres, estamos na “estrada para o inferno climático”, com o pé no acelerador, prestes a atingir a “curva da morte”.

O Brasil sedia dois eventos importantes: a cúpula do G20 neste mês e a COP30 no próximo ano. É uma oportunidade de demonstrar liderança em questões climáticas e de biodiversidade, começando com o esforço para implementar a estratégia para superpoluentes — a melhor estratégia, de fato, pois é a única suficientemente rápida para evitar que o clima ultrapasse pontos de inflexão irreversíveis na próxima década. O último relatório do Sistema de Estimativa de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa classifica o Brasil como quinto maior emissor de metano do mundo — e isso sem considerar o impacto das queimadas que devastaram o país nos últimos meses. A pesquisa de Carlos Nobre mostra que partes da Amazônia já se transformam de sumidouros que removem o dióxido de carbono e o armazenam com segurança, no solo e na biomassa, em fontes de emissão. Ele conclui que, se continuarmos a destruir a Amazônia, ela chegará a um ponto crítico e terminará esse processo por conta própria, transformando-se em savana árida.

O problema do combate ao aquecimento global é que os poluentes climáticos continuam vencendo a corrida contra o tempo. A maioria tem vida longa na atmosfera, permanecendo por centenas ou até milhares de anos. Um exemplo é o dióxido de carbono. Mesmo que suas emissões fossem completa- mente interrompidas, levaria séculos para finalmente deixar a atmosfera, continuando a aquecer a Terra em níveis perigosos.

As más notícias devem nos assustar. Mas também há boas notícias. O Brasil pode mostrar ao mundo como desacelerar o aquecimento nesta década, puxando o freio de emergência do metano antes de atingirmos a curva da morte. A redução do metano e de outros superpoluentes climáticos — refrigerantes, hidrofluorcarbonos, ozônio no nível do solo, fuligem de carbono negro e óxido nitroso — poderia evitar um aquecimento quatro vezes maior até meados do século do que a redução apenas do dióxido de carbono.

Essa solução seria uma tábua de salvação essencial, embora temporária, enquanto enfrentamos as maiores fontes de emissões causadas pelo homem: queimadas, aterros sanitários, indústria de combustíveis fósseis e produção agrícola. É hora de o Brasil assumir sua posição de liderança global, promovendo um acordo vinculativo sobre o metano, conforme proposto pela primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley, e mostrando ao mundo como desacelerar o aquecimento global antes que seja tarde demais.

* Durwood Zaelke é fundador e presidente do Instituto de Governança e Desenvolvimento Sustentável

Artigo publicado no jornal O Globo em 14/11/2024

Link: https://oglobo.globo.com/opiniao/artigos/coluna/2024/11/brasil-precisa-liderar-acordo-global-sobre-metano.ghtml?utm_source=Whatsapp&utm_medium=Social&utm_campaign=compartilhar

 

Educação quilombola e o futuro da biodiversidade

Educação quilombola e o futuro da biodiversidade

Reconhecimento histórico da contribuição dos povos afrodescendentes da América Latina e do Caribe para a proteção da biodiversidade deve passar pela educação dentro dos territórios 

A COP16 das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica, realizada durante o mês de outubro em Cali, na Colômbia, já entrou para a História como um marco na luta dos povos afrodescendentes da América Latina e do Caribe pelo reconhecimento de seu papel na conservação da diversidade biológica e nas decisões multilaterais tomadas sobre o tema. A CONAQ, Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas do Brasil, foi uma das articuladoras deste processo, ao lado de lideranças como a vice-presidente e Ministra da Igualdade e Equidade da Colômbia, Francia Elena Márquez Mina, o PCN (Proceso de Comunidades Negras) e outras organizações afrodescendentes da região. 

Esta conquista sem precedentes, alcançada por meio do trabalho incessante dessas organizações, representa o reconhecimento do que já sabemos há anos: os povos afrodescendentes são detentores de conhecimentos ancestrais de manejo sustentável da natureza, hoje imprescindíveis no combate à crise climática. 

Passado o momento histórico, uma das questões mais prementes é encontrar meios para transmitir este conhecimento de forma a iniciar efetivamente o longo trabalho que temos pela frente.  Não foi por acaso a escolha do tema da redação do ENEM de 2024, “Desafios para a valorização da herança africana no Brasil”, que aponta a importância dos saberes e tradições afrodescendentes. Também não foi à toa que a vice-presidente da Colômbia abriu seu discurso no Fórum Internacional Afrodescendente da COP 16 fazendo uma saudação especial aos estudantes.

Eles são parte fundamental neste processo de transmissão de conhecimento, mas os desafios ainda são muitos.  

No Brasil, os próprios quilombolas enfrentam dificuldades para educar as novas gerações dentro de seus saberes. Além do racismo estrutural e da falta de titulação dos territórios, que muitas vezes impede o acesso das comunidades a políticas públicas, muitos estudantes precisam sair dos quilombos para completar a educação escolar e perdem, assim, a oportunidade de aprender com os seus.  

O direito à educação quilombola está previsto nas Diretrizes Nacionais Curriculares da Educação Escolar Quilombola – DNCEEQ (Resolução n. 08/2012 – CNE/CEB), bem como na Resolução CONANDA número 181/2016, que garante que a educação “deve ser ofertada por estabelecimentos de ensino localizados em comunidades reconhecidas pelos órgãos públicos responsáveis como quilombolas, rurais e urbanas, bem como por estabelecimentos de ensino próximos a essas comunidades e que recebem parte significativa dos estudantes oriundos dos territórios quilombolas.” Este direito também está previsto no novo Plano Nacional de Educação, criado com o projeto de Lei 2614/24 do Poder Executivo, mas a Câmara dos Deputados ainda não marcou data para votação. Por enquanto, ainda vale o plano estabelecido para o período 2014-2024, que deve ser prorrogado até o próximo ano e não faz qualquer referência a educação de comunidades tradicionais.  

Para os estudantes quilombolas, são gritantes as diferenças da educação dentro e fora dos quilombos. É o que contam as meninas quilombolas Maria Leontina Nunes Freitas, 18 anos, de Conceição das Crioulas (PE), e Rhuanny Batista Albernaz, 19 anos, de São Judas Tadeu (PA), em artigo publicado no site Alma Preta. As duas acabaram de concluir o curso da Escola Nacional de Formação de Meninas Quilombolas, uma iniciativa do Coletivo Nacional de Educação da CONAQ com apoio do Fundo Malala. “Concluir os estudos dentro da própria comunidade é uma experiência única porque, além de estarmos rodeadas por pessoas que entendem a cultura, a história e as tradições da população quilombola, também permite a construção de laços fortes com os professores e colegas, que se tornam uma rede de apoio para as estudantes”, diz um trecho do artigo.  

As meninas lembram também que ter professores especializados em conteúdo quilombola é fundamental, já que eles levam para a sala de aula a história e os saberes de seus antepassados: “Aprendemos sobre a resistência do povo que nos originou e que nos inspira a lutar pela preservação de tudo o que envolve essa ancestralidade”, afirmam elas, lembrando ainda que  estudar dentro dos quilombos contribui para a continuidade das ações de preservação da biodiversidade praticadas há séculos pelos seus ancestrais: “A cultura e a agricultura quilombolas estão enraizadas em práticas sustentáveis de manejo da natureza.”  

Lideranças quilombolas assinam embaixo desta necessidade de uma educação diferenciada para as crianças dos territórios. Considerado um guardião dos saberes ancestrais quilombolas, Mestre Naldo, líder da comunidade Custaneira, no Piauí, e coordenador estadual da CONAQ, acredita que a educação sobre a cultura afro-brasileira é fundamental para o aumento da representatividade dos povos afrodescendentes no Brasil. Bisneto de escravizados, Mestre Naldo faz questão de ensinar aos mais jovens, dentro do quilombo, os saberes, as artes ancestrais e a prática das religiões de matriz africana. Para ele, esses ensinamentos são um instrumento de resistência e preservação da cultura ancestral afrodescendente.  

 Links: https://almapreta.com.br/sessao/quilombo/meninas-quilombolas-a-importancia-da-educacao-dentro-do-territorio/ 

http://portal.mec.gov.br/expansao-da-rede-federal/323-secretarias-112877938/orgaos-vinculados-82187207/18693-educacao-quilombola

https://www.mpma.mp.br/arquivos/CAOPIJ/docs/res-181.pdf

https://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/Projetos/Ato_2023_2026/2024/PL/pl-2614.htm 

Arte: Conaq 

COP 16: compromisso para proteger a biodiversidade no planeta 

COP 16: compromisso para proteger a biodiversidade no planeta 

Paz com a Natureza é a mensagem central da 16ª Conferência das Partes (COP-16) da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) das Nações Unidas, que acontece em Cali, na Colômbia, de 21 de outubro a 1º de novembro de 2024. Este ano, a Amazônia, floresta detentora do maior patrimônio em sociobiodiversidade do mundo, enfrenta as consequências da maior crise climática da História e será um dos principais focos de atenção em quase todas as discussões.

O interesse pela Amazônia já começa pela escolha da imagem usada para representar o evento: a flor de Inírida, endêmica da floresta na Colômbia. Por muito tempo vista como uma “erva daninha”, sua escolha reconhece a resiliência em meio às dificuldades climáticas, já que a Inírida é altamente adaptável e sobrevive até em solos inférteis.   

Passados quatro anos, esta COP é a primeira oportunidade de se debater a implementação do Marco Global da Biodiversidade (MGB) Kunming-Montreal, aprovado na COP15 de Montreal, no Canadá, em 2022. O acordo, assinado por 196 nações, estabelece quatro objetivos principais para 2050 e 23 metas de ação para 2030, com o propósito de impedir e reverter a perda de biodiversidade no planeta. É isso mesmo: o acordo foi assinado, mas ainda não foi implementado pelos países signatários. Para o bem do planeta e da humanidade, chegou a hora de colocar isso em prática.  

O Brasil participa da conferência com uma agenda ambiciosa. O país apresenta mais de 20 temas para debate, voltados para o desenvolvimento sustentável e a proteção ambiental. Entre os temas abordados pelo governo, o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa, que acaba de ser aprovado e  contempla todos os biomas brasileiros, e a volta da participação social no debate ambiental a partir da reinstalação da Comissão Nacional da Biodiversidade. 

Um dos temas mais urgentes desta conferência é a necessidade de reconhecer os povos tradicionais como detentores dos saberes necessários para o manejo sustentável da biodiversidade. São eles que detêm o conhecimento ancestral das tecnologias que a própria natureza apresenta para a sobrevivência das espécies e, portanto, devem ocupar lugares centrais nos debates e decisões desta e de outras conferências sobre biodiversidade e meio ambiente.

A Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), por exemplo, leva à COP-16 o painel “O papel dos territórios quilombolas na defesa da vida e da biodiversidade da Amazônia”. A organização pretende abordar o tema com foco na regularização fundiária e na proteção ambiental, sugerindo que a garantia de titulação de terras para comunidades quilombolas é uma estratégia central para a preservação de ecossistemas, contribuindo para a biodiversidade e para a sustentabilidade do bioma amazônico.

 A CONAQ também participa da Coalizão Pelos Direitos Territoriais e Ambientais dos Povos Afrodescendentes da América Latina e Caribe, juntamente com as organizações Rights and Resources Initiative (RRI) e Proceso de Comunidades Negras (PCN) e a Vice-Presidente da Colômbia, Francia Márquez, uma das principais lideranças deste movimento e articuladora da COP-16. Em junho de 2024, a coalizão reuniu líderes afrodescendentes, organizações da sociedade civil, ONGs e representantes do governo a fim de formular um documento com 15 recomendações para reduzir a desigualdade e proteger os direitos dos povos afrodescendentes na América Latina e no Caribe, para que seja garantida a segurança de povos e territórios fundamentais para a sobrevivência do planeta. 

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