O país pode mostrar ao mundo como desacelerar o aquecimento nesta década, puxando o freio de emergência
Por Durwood Zaelke*
O Brasil está numa encruzilhada crítica: com seu tamanho, posição geográfica, biodiversidade e reservas de água doce, pode liderar a nova economia verde de que o mundo precisa com urgência. Mas o tempo é limitado, e há muito a fazer.
A eleição de Donald Trump nos Estados Unidos representa um desafio adicional. Conhecido por sua flexibilização regulatória e apoio ao setor de combustíveis fósseis, Trump prometeu linha dura em relação às restrições ambientais e sinalizou o retorno às políticas que priorizam os combustíveis fósseis, com seu slogan de campanha, drill, baby, drill (perfure, querido, perfure). Como os Estados Unidos são a maior economia do mundo e o segundo maior emissor de gases de efeito estufa, suas decisões terão impacto direto na luta global contra as mudanças climáticas.
Como alertou o secretário-geral da ONU, António Guterres, estamos na “estrada para o inferno climático”, com o pé no acelerador, prestes a atingir a “curva da morte”.
O Brasil sedia dois eventos importantes: a cúpula do G20 neste mês e a COP30 no próximo ano. É uma oportunidade de demonstrar liderança em questões climáticas e de biodiversidade, começando com o esforço para implementar a estratégia para superpoluentes — a melhor estratégia, de fato, pois é a única suficientemente rápida para evitar que o clima ultrapasse pontos de inflexão irreversíveis na próxima década. O último relatório do Sistema de Estimativa de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa classifica o Brasil como quinto maior emissor de metano do mundo — e isso sem considerar o impacto das queimadas que devastaram o país nos últimos meses. A pesquisa de Carlos Nobre mostra que partes da Amazônia já se transformam de sumidouros que removem o dióxido de carbono e o armazenam com segurança, no solo e na biomassa, em fontes de emissão. Ele conclui que, se continuarmos a destruir a Amazônia, ela chegará a um ponto crítico e terminará esse processo por conta própria, transformando-se em savana árida.
O problema do combate ao aquecimento global é que os poluentes climáticos continuam vencendo a corrida contra o tempo. A maioria tem vida longa na atmosfera, permanecendo por centenas ou até milhares de anos. Um exemplo é o dióxido de carbono. Mesmo que suas emissões fossem completa- mente interrompidas, levaria séculos para finalmente deixar a atmosfera, continuando a aquecer a Terra em níveis perigosos.
As más notícias devem nos assustar. Mas também há boas notícias. O Brasil pode mostrar ao mundo como desacelerar o aquecimento nesta década, puxando o freio de emergência do metano antes de atingirmos a curva da morte. A redução do metano e de outros superpoluentes climáticos — refrigerantes, hidrofluorcarbonos, ozônio no nível do solo, fuligem de carbono negro e óxido nitroso — poderia evitar um aquecimento quatro vezes maior até meados do século do que a redução apenas do dióxido de carbono.
Essa solução seria uma tábua de salvação essencial, embora temporária, enquanto enfrentamos as maiores fontes de emissões causadas pelo homem: queimadas, aterros sanitários, indústria de combustíveis fósseis e produção agrícola. É hora de o Brasil assumir sua posição de liderança global, promovendo um acordo vinculativo sobre o metano, conforme proposto pela primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley, e mostrando ao mundo como desacelerar o aquecimento global antes que seja tarde demais.
* Durwood Zaelke é fundador e presidente do Instituto de Governança e Desenvolvimento Sustentável
Artigo publicado no jornal O Globo em 14/11/2024