julho 2025 | Direitos humanos
No momento em que o mundo convoca pela urgência de ações climáticas e respeito aos direitos humanos, o Congresso brasileiro avança com o chamado “PL da Devastação” (PL 2.159/2021), que desmantela o licenciamento ambiental e ignora os territórios de povos indígenas e quilombolas. Isso é ainda mais grave após o parecer consultivo da Corte Interamericana de Direitos Humanos, divulgado no início de julho, que liga direitos humanos e crises climáticas.O artigo a seguir, publicado no Correio Braziliense, expõe como o Congresso desrespeita a sociedade e o clima, omitindo ciência e diálogo, ao mesmo tempo em que coloca o Brasil em xeque antes da COP‑30 em Belém.
Congresso ignora sociedade e clima com PL da Devastação
Os parlamentares não poderão dizer que estavam desavisados. A Corte IDH divulgou um parecer consultivo histórico sobre a relação entre emergências climáticas e proteção dos direitos humanos
Por Juliana de Paula Batista — advogada socioambientalista e Vercilene Francisco Dias, coordenadora do Departamento Jurídico da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq)
A Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) divulgou, no começo de julho, um parecer consultivo histórico sobre a relação entre emergências climáticas e proteção dos direitos humanos. O documento vincula os países que se submeteram à jurisdição da Corte IDH, caso do Brasil, a adequarem suas leis, políticas públicas e ações aos parâmetros mais eficazes para a proteção dos direitos tratados no parecer. “Os Estados têm a obrigação de agir (…) para combater as causas humanas das alterações climáticas e proteger as pessoas sob a sua jurisdição dos impactos climáticos, em particular aquelas que se encontram em situação de maior vulnerabilidade”, diz o parecer.
A boa-nova, no entanto, encontra um clima pouco amigável no Brasil com a aprovação, na madrugada de 17 de julho, do PL 2.159/2021, ou o PL da Devastação, na Câmara dos Deputados. O projeto, que agora segue para sanção ou veto do presidente da República, desmonta, de modo preocupante, as regras para o licenciamento ambiental de obras e atividades, alterando o arcabouço vigente desde a redemocratização.
Se for mantido, permitirá que empreendimentos altamente impactantes sejam licenciados a toque de caixa. Terras indígenas e quilombolas, por exemplo, só serão consideradas se já estiverem nas fases finais de um longo e complexo processo de regularização fundiária, o que pode demorar mais de 30 anos. As terras que estão nas fases iniciais do processo de demarcação ou titulação poderão ser solenemente ignoradas, e grandes empreendimentos nelas instalados. Os impactos não serão estudados, tampouco prevenidos, mitigados ou compensados. O que restará serão danos irreparáveis.
A estratégia não é ingênua e foi pensada justamente para criar fatos consumados por terceiros nessas áreas, inviabilizar a posse plena da terra e gerar ainda mais insegurança jurídica para os direitos fundamentais de indígenas e quilombolas. As terras indígenas e quilombolas estão entre as principais barreiras contra o avanço do desmatamento no Brasil. Dados do Mapbiomas mostram que, nos últimos 30 anos, terras indígenas perderam apenas 1% de vegetação nativa, enquanto nas áreas privadas a perda foi de 20,6%.
Legislar contra o meio ambiente e em prejuízo das terras indígenas e quilombolas viola frontalmente uma das conclusões unânimes da Corte IDH: os estados devem adotar as medidas legislativas, administrativas e de política pública adequadas para garantir a proteção dos territórios dos povos indígenas, quilombolas e de comunidades tradicionais, além de implementar estratégias voltadas para reforçar, a curto e longo prazo, a resiliência e a capacidade de adaptação climática desses povos.
O Congresso Nacional não se preocupou com nada disso. Tampouco considerou o melhor conhecimento científico disponível para tomar suas decisões. O campo científico não foi convidado para sentar à mesa e apresentar estudos que pudessem nortear uma discussão racional sobre as consequências da nova lei para o clima. Qual será o impacto? Ninguém sabe.
Mas, os parlamentares não poderão dizer que estavam desavisados. A Corte IDH alertou que os países devem fortalecer o Estado Democrático de Direito como marco essencial para proteger os direitos humanos, a eficácia da ação pública e uma participação cidadã aberta e inclusiva. Com ouvidos moucos, eles preferiram a seletividade que lhes mantêm beneficiados por lobbies e emendas. A sociedade? Que coma brioches.
É fundamental que se coloque freio de arrumação em um Congresso que legisla de costas para a sociedade. A emergência climática já sacrifica os brasileiros, especialmente os mais pobres, como vimos nas enchentes que assolaram o Rio Grande do Sul ou nos incêndios florestais que consumiram o Pantanal.
Na antevéspera da Conferência das Partes (COP-30), que acontece em Belém, em novembro, o Congresso Nacional boicota o papel do Brasil como um país que poderia estar na vanguarda das negociações climáticas. Nesse cenário, o parecer consultivo da Corte IDH é um instrumento importante para fortalecer — seja nas prováveis judicializações que devem acabar no Supremo Tribunal Federal, seja na própria Corte IDH — a defesa do meio ambiente.
Para os indígenas e quilombolas, que resistem dia a dia, o parecer da Corte IDH será uma ferramenta de luta para manter em pé seus povos e vivos os seus territórios.
julho 2023 | Climate change, Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Mudanças Climáticas
Um bom termômetro para saber se uma festa está acabando é olhar quanto gelo ainda sobrou no freezer. É hora de acender as luzes e tirar a música no planeta Terra: nada menos que quatro recordes seguidos de temperatura média global foram quebrados na semana passada. O ponto alto aconteceu na última quinta-feira (6/7), com 17,23ºC, o dia mais quente já registrado. Esse calorão vem reduzindo o estoque de gelo do planeta – e, consequentemente, fazendo com que ele esquente mais e mais. Em fevereiro, a Antártida derreteu como nunca; e no mês passado, chegou ao nível mais baixo para um mês de junho, início de inverno. Como se tivessem desligado o congelador no meio da farra.
O Continente Antártico havia perdido quase uma Argentina de gelo – 2,5 milhões km² – no fim do mês passado, em relação à superfície média de 1991 a 2020. Em 16 de fevereiro, a camada de gelo sobre o mar tinha sido reduzida a 2,06 milhões km², a menor área registrada desde o início do monitoramento por satélite, há 45 anos. A recuperação tem sido bem lenta, chegando a 11,5 km², 17% abaixo do normal. O mais preocupante é que, até bem pouco tempo, as mudanças climáticas vinham poupando a Antártida: foram 35 anos de estabilidade e, em setembro de 2014, chegou a atingir a maior extensão coberta desde 1979: 20 milhões de km². A partir de 2015, a queda foi constante e a falta de gelo não só contribui com o aquecimento do planeta, como pode levar espécies à extinção.
Se não faz frio o suficiente no inverno do Hemisfério Sul, o verão no Norte promete ferver. Um estudo publicado na revista científica “Nature Medicine” calcula que até 94 mil pessoas podem morrer por causa do calor na Europa em 2040, caso nenhuma providência seja tomada. O ano de 2022 foi o mais quente registrado no continente e matou 61.672 pessoas. Na Itália, uma forte onda de calor, causada por um anticiclone chamado Cerberus, vai fazer a temperatura passar dos 40ºC na maior parte do país e chegar a até 48ºC na Sicília e na Sardenha. Os italianos enfrentaram inundações e tempestades na primavera, e Alemanha, Espanha, França e Polônia também devem ser bastante castigadas pelo sol nos próximos dias. É o mesmo disco arranhado tocando sem parar desde 2015.
Uma boa nova vem da Amazônia: o desmatamento está em queda constante. No primeiro semestre, diminuiu 34% em relação ao mesmo período do ano passado; em junho, a queda foi de 41%, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Mas ainda não há o que festejar: o El Niño ronda ameaçadoramente a maior floresta tropical do mundo. É um círculo vicioso, a derrubada da mata alimenta o aquecimento global, que põe fogo no verde. Os focos de calor cresceram 10,7% nos primeiros seis meses do ano, chegando a 8.344, e atingem o maior número desde 2019 – quando foram 10.606. E se o desmatamento diminui na Amazônia, ele vem crescendo vertiginosamente no bioma vizinho. O Cerrado já perdeu 4.408 km², 21% a mais que no primeiro semestre de 2022, o que dá quase quatro cidades do Rio de Janeiro.
O clima pode ser de fim de festa, mas não é hora de tocar a marcha fúnebre. Nada de desânimo, todos nós podemos colaborar para mudar esse quadro preocupante. Uma dica: o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima abriu um canal para consulta popular, onde é possível votar nas iniciativas do Programa Plurianual Participativo (PPA) do governo federal, como o projeto de Combate à Emergência Climática, por exemplo. Além disso, também é possível mandar propostas. Mas não dá pra esperar a festa acabar: as votações estão abertas até 14 de julho, é preciso agir logo. Só temos este planeta, brindemos à sua saúde e cuidemos dela!
Saiba mais:
Brasil Participativo Enfrentamento da Emergência Climática
https://brasilparticipativo.presidencia.gov.br/processes/programas/f/1/proposals/50
Camada de gelo no mar da Antártica chega ao nível mais baixo já registrado em um mês de junho
https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2023/07/10/camada-de-gelo-no-mar-da-antartica-chega-ao-nivel-mais-baixo-ja-registrado-em-um-mes-de-junho.ghtml
Gelo da Antártida enfrenta dificuldade para se recompor após derretimento recorde
https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2023/07/gelo-da-antartida-enfrenta-dificuldade-para-se-recompor-apos-derretimento-recorde.shtml
Planeta registra o mês de junho mais quente da história, diz observatório europeu
https://g1.globo.com/meio-ambiente/noticia/2023/07/06/planeta-registra-o-mes-de-junho-mais-quente-da-historia-diz-observatorio-europeu.ghtml
Mais de 61 mil pessoas morreram de calor na Europa no verão de 2022, diz estudo
https://g1.globo.com/mundo/noticia/2023/07/10/mais-de-61-000-pessoas-morreram-de-calor-na-europa-no-verao-de-2022.ghtml
Onda de calor na Itália pode gerar temperatura recorde na Europa
https://veja.abril.com.br/mundo/onda-de-calor-na-italia-pode-gerar-temperatura-recorde-na-europa
Entenda os fatores que causam os recordes de temperatura no planeta Terra
https://g1.globo.com/meio-ambiente/noticia/2023/07/05/entenda-os-fatores-que-causam-os-recordes-de-temperatura-seguidos-no-planeta-terra.ghtml
As medidas para evitar que El Niño provoque ‘hecatombe’ na Amazônia
https://www.bbc.com/portuguese/articles/cx05w4kee92o
fevereiro 2023 | Amazônia, Biodiversidade, Direitos indígenas, Garimpo, Povos Tradicionais, Tapajós
Puyr Tembé, presidente da Federação dos Povos Indígenas do Estado do Pará (Fepipa) e secretária dos Povos Indígenas do Pará
A mãe do Brasil é indígena. Foi uma de nós quem deu à luz esta terra. Nossa ligação com ela é verdadeiramente ancestral. O mundo inteiro se comoveu com o martírio dos Yanomami e correu para ajudá-los. Sou mãe: consigo imaginar, como se fosse minha, a dor de quem perde o filho ou que não pode amamentá-lo; ou das mulheres que sofreram violência sexual e abortaram por espancamento. Infelizmente, os Yanomami não são os únicos que correm o risco de serem dizimados por causa da cobiça alheia: eu, por exemplo, vivo num estado tão ou mais ameaçado pelo garimpo ilegal que Roraima. Por isso dediquei minha vida à luta pela defesa de nossas terras.
Nasci há 44 anos na aldeia São Pedro, na Terra Indígena Alto Rio Guamá, no sudoeste do Pará. Sou mãe de três filhas, avó e milito desde muito jovem; só que nos últimos quatro anos, nós, mulheres e lideranças indígenas, tivemos que decidir entre lutar para viver, ou esperar pela morte. A forma como fomos (des)tratadas durante a pandemia acendeu definitivamente o alerta. Hoje, presido a Federação dos Povos Indígenas do Estado do Pará (Fepipa) e fui convidada para assumir a recém-criada Secretaria dos Povos Indígenas do Pará. Além disso, faço parte da União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira e sou cofundadora da Associação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga).
Mais da metade das áreas de garimpo do país ficam no Pará, muitas delas em unidades de conservação e em nossos territórios. Estima-se que 60 mil garimpeiros atuam só na Bacia do Rio Tapajós. Na mesma região, vivem 13 mil Munduruku; ou seja, eles estão em minoria em suas próprias terras. Os efeitos já podem ser sentidos: a Polícia Federal calcula que foram despejados cerca de 7 milhões de toneladas de rejeitos tóxicos na bacia hidrográfica, enquanto um estudo da Fundação Oswaldo Cruz revelou que mais da metade da população de três aldeias (Sawré Muybu, Sawré Aboy e Poxo Muybu) tem mercúrio no organismo acima do recomendado.
É por isso que temos muitas frentes de batalha, mas a maior delas é lutar pela vida. E quando dizemos isso, falamos de demarcação e desintrusão de terras indígenas. Protegendo nossas terras, preservamos sua biodiversidade e nossas próprias vidas, e ajudamos a proteger a própria Humanidade. Os povos indígenas agora falam de igual para igual com a sociedade como um todo. Hoje estamos no governo, devemos executar em vez de solicitar. Mas eu continuo sendo Tembé.
Estamos lutando pelas que já não estão mais aqui, levadas pela pandemia ou pelo mercúrio, por nossa ancestralidade; e pelas nossas que ainda estão por vir, o nosso futuro. Só que nós, mulheres do movimento indígena, não vamos conseguir fazer isso sozinhas. Ainda precisamos do Estado, dos parceiros, dos aliados, das entidades que sempre nos deram apoio, colaboradores e simpatizantes. Toda a população brasileira deve assumir conosco a maternidade/paternidade deste país.
julho 2022 | Mudanças Climáticas
Parece notícia do ano passado ou retrasado, mas o Hemisfério Norte está pegando fogo e recordes de temperatura são batidos todos os dias. As projeções para o Brasil são igualmente preocupantes – a gente fala disso mais adiante. Até segunda-feira (18/7), Portugal registrou 659 mortes por causa das altas temperaturas; na Espanha, já morreram pelo menos 500 pessoas e se espera que no fim de semana passe dos 44° C em Sevilha. A área destruída pelos incêndios no continente já é maior que a de 2021 e poderá superar a de 2017, a maior já registrada. É fogo!
Na Inglaterra, os termômetros marcaram 40,2°C em Londres, um calor nunca visto no país, praticamente uma febre alta – segundo as previsões, isso só aconteceria em 2050. Para quem vive num país tropical já é o maior perrengue; agora imaginem para um cidadão inglês médio, que mora em casas com janelas minúsculas, não tem ar-condicionado ou sequer um ventilador em casa e não pode nem pegar um refresco em algum prédio com sistema de refrigeração central, já que são raros?
A coisa está tão feia na França que fazendeiros estão fazendo a colheita à noite, para evitar que o calor dos tratores cause incêndios. No sudoeste do país, mais de 100 km² queimaram e obrigaram 16 mil pessoas a fugirem de suas casas. A Terra gira em torno de seu eixo; mas como ele é ligeiramente inclinado, o sol bate mais diretamente no sul do que no norte. Por isso, faz mais frio por lá. Por isso os europeus têm se empenhado tanto em reduzir suas emissões de efeitos do gás estufa. A invasão da Ucrânia pela Rússia puxou o feio de mão do processo, pois eles estão sendo obrigados a usar mais carvão na produção de energia.
As mudanças climáticas são uma consequência do aquecimento global. É por causa desse desequilíbrio que, por exemplo neva com cada vez mais frequência no sul do país. Funciona assim: o Brasil recebe da Antártida correntes de ar frio e manda para lá massas de ar quente. É uma espécie de sintonia fina que pode ser bagunçada à menor variação. Como tem feito um calor anormal na Região Sul – as secas estão aí como prova – há uma perturbação nesse delicado sistema de trocas, que abre espaço para a entrada de frentes frias cada vez mais violentas. Mas, diferentemente do pessoal do norte, temos uma matriz energética relativamente limpa. O que pega é a famosa “vontade política”.
Como prometemos no primeiro parágrafo, vamos adiantar a previsões para as próximas temporadas de incêndio no país. E elas são de arrepiar. Até meados do mês passado, 6. 220 km² de Amazônia já tinham sido carbonizados – contra 4.400 km² do mesmo período em 2021. O número é 30% superior à média histórica para o primeiro semestre e o Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (Inpe) detectou 2.562 focos de calor, a maior quantidade desde 2007. No ano passado, a maior floresta tropical do mundo perdeu 18 árvores por segundo, mas as autoridades responsáveis prometem se empenhar para superar a marca.
Para começar, inventaram a pedalada pirotécnica: criaram um grupo para definir o que pode ou não ser classificado como desmatamento e queimada. A tal comissão de notáveis não tem sequer um nome ligado ao Inpe, órgão reconhecido internacionalmente pela sua excelência, mas gente ligada aos ministérios da Defesa, da Justiça e Segurança Pública, da e da Economia. Ou seja, só gente que entende do riscado – no sentido de riscar florestas do mapa. E a cereja encharcada de querosene do bolo: o governo gastou só 18% do orçamento destinado à prevenção e ao combate a incêndios. O pior é que, como a situação piora a cada ano, esses ainda serão considerados os bons velhos tempos, caso a gente não forme nosso próprio corpo de bombeiros. Os hidrantes são as urnas.
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janeiro 2022 | Uncategorized
É bonito ver a mobilização para ajudar aqueles que perderam seus lares nas inundações que assolam boa parte do país. Mas dois povos estão particularmente desamparados nessa catástrofe. Parte considerável de indígenas e quilombolas vive em locais de difícil acesso, aonde nem sempre chega ajuda. Exemplos de resistência e historicamente perseguidos, ambos se viram ainda mais acuados desde a posse do governo atual. Por isso, são os que mais precisam de nossa ajuda nesse momento. É hora de exercitar os ensinamentos ancestrais dos povos originários e tradicionais e cuidarmos uns dos outros, e lutar para dar mais visibilidade aos que o Brasil oficial quer fingir que não existem.
De acordo com a Federação Indígena das Nações Pataxó e Tupinambá do Extremo Sul da Bahia (Finpat) e o Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas da Bahia (Mupoiba), 51 comunidades – cerca de 5.940 famílias ou 29.700 mil pessoas – dos povos Pataxó, Tupinambá, Pataxó Hã Hã Hãe, Imboré/Kamakã e Pankarú, foram atingidas apenas naquela região do estado; já a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) calcula que só em Minas Gerais, Bahia, Tocantins e Goiás são pelo menos 12 mil famílias afetadas.
“O sertanejo antes de tudo é um forte, por isso estamos sobrevivendo, cada um se virando como pode. A viagem precisa ser feita a cavalo, em muitas comunidades há mutirões para desatolar os veículos que tentam chegar à cidade”, conta Nelci Conceição, liderança do Quilombo Aroeira, localizado no município baiano de Palmas de Monte Alto, região de Caatinga e Cerrado, onde ficam mais 17 comunidades. A estrada que leva os quilombos locais até a cidade é de barro e está intransitável; uma viagem que antes levava uma hora e meia hoje chega a durar seis. “Tenho visto em reportagens autoridades sobrevoando áreas atingidas de helicóptero, mas não somos lembrados. A comunicação é difícil, pois falta energia e a internet é cara”, diz ela.
Nelci conta ainda que em dezembro do ano passado previram que a região poderia ser atingida por temporais, mas seus alertas foram ignorados. “Desde 1992 não chovia tanto por aqui, estávamos sofrendo com a seca, mas notamos sinais de que o tempo estava mudando. E o nosso pedido de asfaltamento da estrada foi protocolado em 2019 e nada foi feito”. Foram ignorados como se não existissem.
E além de o governo fazer vista grossa para as mazelas desses povos, é como se eles estivessem pagando por um crime cometido por outrem. Por exemplo: no último dia do ano que passou, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) divulgou que o Cerrado perdeu mais 8.531,44 km² de mata nativa de agosto de 2020 a julho de 2021. Foi a maior devastação registrada no bioma, presente em Goiás, Tocantins, Maranhão, Piauí, Bahia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e São Paulo. Não por acaso, esses estados estão entre os mais atingidos: os grandes produtores rurais comeram o verde para plantar soja até a beira do rio que, por causa disso, acaba transbordando.
Como desgraça pouca é bobagem, também no apagar das luzes de 2021 o presidente sancionou a lei que modifica as regras de proteção de margens de rios em áreas urbanas, estabelecidas pelo Código Florestal. Agora a responsabilidade cabe às prefeituras – ou seja, fica a sabor do curso das eleições da ocasião. Mais destruição e sofrimento à vista.
Segundo dados preliminares do IBGE, que este ano deve realizar um censo especial voltado para os quilombolas, eles são 1.133.106. Bahia e Minas, os estados mais afetados pelas cheias, junto com Tocantins, também são os que abrigam mais quilombos: 1.046 e 1.021, respectivamente. Hoje, praticamente o mundo inteiro conhece o papel fundamental dos indígenas na preservação das florestas, mas nem todos sabem que os quilombolas também fazem um trabalho importantíssimo nesse terreno.
A mesma pesquisa do IBGE diz que existem pelo menos mil quilombos na Amazônia; e já há algum tempo se conhece a dimensão de sua influência na conservação dela. Um estudo sobre isso foi realizado pela Comissão Pró-Índio de São Paulo em 35 comunidades da região de Oriximiná, no Norte do Pará, em 2011. São 6.944 km² de floresta; até o ano 2000, a região havia perdido 64 km² de vegetação nativa e entre 2006 e 2009, somente 6 km². Falta um reconhecimento maior desse feito. “Isto é devido ao modo que os quilombolas exploram a floresta. Eles vivem um modelo econômico com ênfase no extrativismo”, disse na época Lúcia Andrade, coordenadora-executiva da instituição.
Indígenas e quilombolas são povos que diariamente cuidam do planeta e do nosso futuro – e, justamente por isso, são tão perseguidos. Então, não custa lembrar que além de ser um belo sentimento, a empatia também é fundamental para aguçar nosso instinto de sobrevivência. Vendo o que estão passando nossos irmãos Brasil adentro você também não sente a água batendo nas canelas? Ficar ao lado deles é resistir contra a destruição de tudo o que temos de mais precioso.
Clique aqui e veja como ajudar os quilombolas
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