O clima não está normal nem aqui, nem lá na China. Junho e julho de 2019 foram os mais quentes da História, recordes de calor foram batidos em todo o Hemisfério Norte. Houve apagões em Nova York, o fogo queima florestas no Ártico, os termômetros marcaram 45,1°C na França (42,6°C em Paris) e 800 milhões (!) de chineses estão sendo afetados pelas temperaturas de mais de 40°C que atinge suas metrópoles.
Parlamentos de Alemanha, Argentina, Austrália, Bélgica, Canadá, Espanha, EUA, França, Irlanda, Itália, Nova Zelândia, Reino Unido, República Checa e Suíça decretaram emergência climática. A Organização Meteorológica Mundial (OMM) não tem dúvida: essas ondas de calor “carregam a assinatura da mudança climática provocada pelo homem”.
O homem causa e paga: segundo um relatório da seguradora alemã Munich Re, desastres naturais causados pelo desequilíbrio no clima provocaram prejuízos de US$ 42 bilhões no primeiro semestre. Por isso, mesmo que o presidente Donald Trump vá abolir as regras adotadas no governo Barack Obama para reduzir emissões de poluentes por veículos, a Califórnia e outros 13 estados americanos continuarão a aplicá-las. Quatro das maiores montadoras do mundo instaladas nos Estados Unidos – Ford, Volkswagen, Honda e BMW – juntaram-se esta semana ao grupo de dissidentes.
Está acontecendo mais rápido do que esperávamos. No ano passado, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) anunciou que as emissões de CO₂ teriam que ser reduzidas em 45% até 2030, para manter o aumento das temperaturas médias globais abaixo de 1,5°C até o fim do século. Hoje, os cientistas reconhecem que será preciso corrigir essa meta e que os próximos 18 meses serão fundamentais.
Neste momento, estamos nos encaminhando para 3°C de aquecimento até 2100, o que seria catastrófico para a vida – humana e animal – no planeta. “A matemática do clima é brutalmente clara: embora o mundo não possa ser curado nos próximos anos, pode ser fatalmente ferido por negligência até 2020”, diz Hans Joachim Schellnhuber, fundador e diretor emérito do Instituto Potsdam de Pesquisas sobre o Impacto Climático.
Assim como nos EUA, no Brasil parece haver um descompasso entre o que pensam opinião e o poder públicos. Pesquisas recém-divulgadas pelo Instituto Datafolha apontam que 85% da população, que sofre os efeitos na pele, acredita que o planeta está esquentando e 72% concordam que a causa é a atividade humana; que 86% dos brasileiros rejeitam a ideia de abrir as terras indígenas para a mineração. Enquanto isso, o governo, que é uma entidade abstrata, luta contra a Ciência e os fatos. Não se detém catástrofes por decreto.
Na semana que passou comemoramos O Dia Internacional do Meio Ambiente e também o Dia Mundial dos Oceanos. Ficamos cientes de dados como as 8 milhões de toneladas de plástico que são descartadas no mar todos os anos. E vimos também que, se até 2050 nada for feito com relação isso, teremos mais plástico do que peixes nos mares.
Na última semana, o presidente americano Donald Trump deixou o Acordo de Paris, o que pode atrapalhar o objetivo do tratado e não reduzir as mudanças climáticas como se esperava. Um dos reflexos deste fenômeno é o aumento da temperatura no planeta, que coloca em risco principalmente a Antártica e o Ártico, causando, entre outros problemas, o derretimento de geleiras. Isso pode causar a elevação do nível dos oceanos e fazer desaparecer lugares como as Ilhas Maldivas, onde o presidente fez um apelo para que Trump não abrisse mão do acordo.
Mas voltando ao Ártico. As consequências das mudanças climáticas por lá são mais fortes e muitas vezes sentidas primeiro do que em outros locais do planeta.
Recentemente, o banco mundial de sementes, criado pela Noruega e que fica no extremo norte no país, na região do Ártico, foi parcialmente inundado por conta do derretimento do permafrost (o solo da região ártica, uma camada de gelo que, ao menos em tese, não deveria derreter). Felizmente, nada se perdeu e o governo norueguês já divulgou um plano para conter possíveis futuros acidentes causados principalmente pelas mudanças climáticas na região.
Estudos mostram que a diminuição da cobertura de gelo no Ártico, foi de 74% entre 2009 e 2016, como divulgou o secretário-geral da Organização Mundial Meteorológica, Petteri Taalas. A área congelada é a menor já registrada por satélite, em quase quatro décadas, em pleno inverno na região, segundo a NASA.
Abaixo, o vídeo feito pela própria NASA mostrando as mudanças na formação de gelo na região do Ártico:
A perda de cobertura de gelo está afetando o ecossistema na região, como o tempo de florescimento dos fitoplânctons, os organismos microscópicos que estão na base da cadeia alimentar marinha. Além disso, os ursos polares, morsas, baleias e outros animais dependem do gelo marinho para sobreviver.
Quem está se beneficiando por esse degelo é o homem, o principal causador dele. Com a diminuição da área congelada, aumenta a invasão humana, expandindo atividades como a pesca, o turismo, o transporte a até a exploração de petróleo na região. Japão, China e Coreia do Sul anunciaram que se uniram para um estudo científico conjunto no oceano Ártico para preparar o terreno para a abertura de novas rotas de transporte e exploração de recursos.
No norte do Canadá, o aumento das temperaturas está fazendo com que as estradas de gelo formadas no longo e denso inverno da região se formem mais tarde que o habitual e derretam antes do esperado. Essas estradas são importantes para o transporte de combustível, madeira, diamantes e carcaças de alce para as minas e comunidades remotas da região.
As pessoas que vivem por lá esperam ansiosamente pelo inverno para que as estradas de gelo, que são a sua única garantia de sobrevivência, deem acesso às comunidades isoladas. Esta crise está se tornando uma questão de vida ou morte. Algumas dessas comunidades quase ficaram sem óleo diesel para manter as luzes acesas porque as estradas de gelo foram abertas semanas mais tarde.
Outro dado alarmante é que o derretimento o solo do ártico está liberando antigos vírus e bactérias que, depois de ficarem tanto tempo “dormentes”, voltam à vida e podem acabar causado grandes epidemias.
Conforme a Terra vai aquecendo, mais camadas do permafrost vão derretendo. Normalmente. cerca de 50 cm das camadas mais superficiais desse solo derretem no verão. Mas com o aquecimento global, camadas mais profundas e antigas têm derretido também, liberando esses vírus e bactérias.
E não apenas esses microrganismos são uma ameaça. Conforme a Terra vai aquecendo, os países do Norte vão se tornando mais suscetíveis a epidemias “do Sul”, como malária, cólera, dengue, que são doenças de temperaturas mais quentes. A elevação de temperatura deixa o clima mais propício para a reprodução de mosquitos vetores dessas doenças, como o tão conhecido Aedes aegypti, responsável por transmitir além da dengue, a febre amarela, Chikungunya e Zika.
O clima esquentou entre Donald Trump e o resto do mundo. Bastou o presidente americano, com maior índice de rejeição dos últimos 40 anos, retirar o país do Acordo de Paris para mudanças climáticas, que diversos países emitiram nota de repúdio e preocupação com sua atitude. Durante o anúncio, Trump disse que vai renegociar a entrada dos EUA no tratado, desde que haja mudanças nas regras. Para Alemanha, Itália e França não haverá renegociação.
Ao menos quatro estados, 70 grandes cidades e multinacionais, inclusive petroleiras americanas, já confirmaram que irão manter os acordos firmados em Paris.
A atitude do presidente desagradou não só outras nações como próprios americanos, incluindo sua filha Ivanka, que foi contra a atitude do pai, que coloca em xeque a liderança mundial americana, e até mesmo sua promessa de “fazer os EUA grandes novamente”.
Pode parecer surpreendente, mas existe um movimento em defesa do meio ambiente e do clima dentro do Partido Republicano dos EUA. Diante das medidas e da verborragia negacionistas de Donald Trump, esses conservadores estão buscando multiplicar esforços.
Grupos como o republicEn e a Aliança Católica para o Clima tentam convencer cada vez mais congressistas republicanos a abordar a mudança climática e moderar a agenda presidencial.
Mas, por enquanto, menos de um décimo dos 237 republicanos da Câmara dos Deputados falou em público sobre a questão em 2017.
Há uma pequena vitória ambientalistas conservadores, pelo menos.
O Caucus Soluções para o Clima, um bloco de votação pró-ambiente do Congresso, conseguiu filiar mais republicanos nos últimos dois meses do que em todo o último ano da gestão Obama.
Qualquer bufada de esperança que emane dos arredores da Casa Branca é muito bem-vinda!