Novos caminhos para o futuro

dezembro 2022

Eliane Xunakalo é uma mulher do seu tempo. Percebeu que para manter sua cultura viva e as terras de seus ancestrais intocadas era preciso estar atenta à contemporaneidade e aos movimentos do mundo. Ultimamente, tem se dedicado a estudar créditos de carbono – algo que até outro dia não lhe diria respeito e que muita gente boa desconhece. “Em 2016, já tinha feito pós em Direito Administrativo e Administração Pública, porque entendo que a gente precisa compreender como funciona a estrutura do poder público para poder cobrar. Não basta saber os direitos, tem que conhecer os caminhos”, diz ela, mais uma liderança feminina emergente do movimento indígena e uma fé no futuro. Anotem o nome.

Mãe de três filhos, de 10, 5 e 3 anos, e quatro cachorros, Eliane é Bakairi. Esse povo originário do Cerrado mato-grossense está no meio do maior fogo cerrado: o direto, que vem destruindo o segundo maior bioma brasileiro com incêndios cada vez maiores e constantes; e o que ricocheteia na Amazônia, ao abrir caminho para invasores – os Bakairi vivem em duas terras nos arredores do Parque Nacional do Xingu. Depois de uma eleição difícil, em que enfrentou uma oposição violenta, Eliane foi eleita a primeira presidenta da Federação dos Povos e Organizações Indígenas de Mato Grosso (Fepoimt). Uma vitória histórica.

A votação foi apertada e deixou sequelas. Guerreira que usa a doçura como arma, Eliane prega a conciliação. “Nós, povos indígenas não podemos ser inimigos. Estamos pregando diálogo, união e consenso. Não vamos excluir nenhum povo que pensa diferente da gente, pelo contrário. Foi com essa proposta que nos apresentamos, que fomos eleitos e que vamos trabalhar. Nossa palavra é consulta transparência, protagonismo e força”, diz ela, demonstrando grande maturidade para os seus 36 anos, um contraste com autoridades mais velhas, que perecem crianças.

A Fepoimt foi criada em 2017, representa os 43 povos indígenas do estado. O próprio Cacique Kayapó Raoni se empenhou na campanha. Eliane Xunakalo irá enfrentar pedreiras à frente da federação. O poder mudou de mãos a nível federal, mas permaneceu nas mesmas em Mato Grosso. O governador, um senador e 18 dos 24 deputados estaduais mato-grossenses foram reeleitos. Ela tentou uma vaga na assembleia estadual, mas não foi eleita. “Tive 4.046 votos. São votos importantes porque são limpos e abrem caminhos. Pela falta de recursos e de experiência analiso como um resultado positivo. E sou a primeira indígena eleita como suplente na Assembleia. É um resultado histórico”, analisa.

O fato de ter ao seu lado outras mulheres corajosas como ela é outro motivo de otimismo: Eliane é vice-presidente da União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileiras (Amiab) e cofundadora da Articulação Nacional Das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga), além de ser sou assessora de articulação política e para questões climáticas da Takná, instituição que tem 13 anos e trabalha com os direitos das mulheres indígenas no Mato Grosso.

Mas Eliane nunca esteve sozinha. O marido apoia seu trabalho desde o começo e ela também foi incentivada a estudar por seu povo, pelas lideranças e anciões da sua aldeia. Quando estudou em Cuiabá, aprendeu com o movimento estudantil que era preciso levar a voz do movimento indígena a todos os recantos do planeta. “Nós não somos o atraso. Nós somos os guardiões do bioma, somos os guardiões do futuro. Precisamos que quem está no poder entenda isso”, diz Eliane Xunakalo. O Mato Grosso é a nossa primeira linha de defesa contra a destruição da Amazônia. A tarefa está em boas mãos, mas a Fepoimt precisa do apoio de todos nós.

 

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