É o presente que está em jogo

janeiro 2020

Não se trata de uma gripe de estação e nem de uma previsão para um futuro distante: em estudo divulgado no dia 13 de dezembro, a Organização Mundial de Saúde (OMS) alerta para o perigo do aumento de doenças ligadas às mudanças climáticas nos próximos dez anos. Não custa lembrar que a última década foi a mais quente jamais registrada e que as emissões de gases do efeito estufa (GEE) vêm crescendo e já matam mais de sete milhões de pessoas anualmente. E, segundo o recém-divulgado relatório internacional Lancet Countdown 2019, as crianças serão as mais atingidas, com impacto ao longo de suas vidas. Ou seja, o efeito será duradouro. O resultado confirma o que advertia em 2015 a American Academy of Pediatrics (entidade americana que reúne médicos e gestores de políticas de saúde públicas) e a OMS. Naquele ano, as duas instituições estimavam que 88% das doenças causadas pelo desequilíbrio no clima atingiam crianças com menos de 5 anos.

Uma pesquisa da Anistia Internacional feita em dezembro passado apontou que as mudanças climáticas são consideradas o desafio mais sério da atualidade para os jovens. Numa lista de 23 problemas, na qual os entrevistados podiam escolher cinco, elas estiveram presentes em 41% das respostas, ficando à frente da poluição (36%) e do terrorismo (31%). Não à toa, eles têm ido às ruas no mundo inteiro cobrar ações mais firmes das classes governante e empresarial. As crianças, porém, são vítimas inocentes e pouco podem fazer. Cuidar do futuro delas está inteiramente em nossas mãos.

Porém, recentemente a OMS realizou sua primeira avaliação global sobre o problema com mais de 100 países participantes. E a entidade descobriu que, embora cerca de metade deles tenha desenvolvido estratégias para combatê-lo, menos de um em cada cinco está investindo o suficiente para concretizá-las. Os riscos mais comuns são o estresse por calor, ferimentos ou morte causados por eventos climáticos extremos, fome, desnutrição, falta de água e doenças como cólera, dengue ou malária. “A mudança climática não está apenas gerando uma conta para as gerações futuras pagarem, é um preço pelo qual as pessoas estão pagando agora com sua saúde. É imperativo moral que os países apliquem os recursos necessários para agir contra elas”, afirma Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS.

O Lancet Countdown é produzido por 120 especialistas de 35 instituições – entre elas, a OMS, o Banco Mundial e a Fundação Oswaldo Cruz. Se as emissões de GEE continuarem no patamar atual, uma criança nascida hoje herdará um planeta em média 4° C mais quente até os seus 71 anos. Isso traria riscos à saúde dela durante todas as fases da vida. “Longas secas, chuvas excessivas e incêndios não controlados estão agravando os efeitos sobre a saúde. Impulsionado em parte pelas mudanças climáticas, o crescimento contínuo da dengue pode tornar-se incontrolável em breve, pois a incidência triplicou desde 2014. Lamentavelmente, o desmatamento está aumentando novamente, assim como o uso de carvão”, diz a médica brasileira Mayara Floss, uma das autoras do relatório.

Ainda de acordo com o Lancet Countdown 2019, quem nasce hoje vai enfrentar uma intensificação descomunal da quantidade de eventos climáticos extremos na idade adulta. Houve um aumento de 220 milhões de pessoas acima de 65 anos expostas a ondas de calor entre 2000 e 2018; entre a 2017 e 2018, a alta foi de 63 milhões. Secas e inundações também vão prejudicar sobremaneira a produção de alimentos. O documento conclui que apenas uma redução anual de no mínimo 7,4% nas emissões de GEE entre 2019 e 2050 poderá limitar o aquecimento global a 1,5 °C, a meta estipulada pelo Acordo de Paris. Isso salvaria a vida de cerca de um milhão de pessoas por ano. Na Índia, a desnutrição já causa 2/3 das mortes de crianças com menos de 5 anos. É o presente que está em jogo.

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