Barganha ambiental

julho 2018

Se no futebol já não somos mais os tais, também estamos perdendo pontos no campo da preservação ambiental. O Brasil já foi considerado um campeão na área, mas ultimamente só temos marcado gol contra: um estudo publicado na prestigiada revista científica Nature Climate Change aponta que os retrocessos ambientais dos últimos anos podem custar a palavra que o país deu no Acordo de Paris; ou seja, corremos o sério risco de não cumprir as metas com as quais nos comprometemos no tratado climático. Tudo por causa de uma barganha política, que vem fazendo o desmatamento avançar.

Graças ao jogo de equipe de um governo na marca do pênalti com a bancada ruralista, a motosserra voltou a correr solta na Amazônia e no Cerrado. E não só a reputação de nosso país e o meio ambiente que estão ameaçados, mas também as finanças. Para compensar os efeitos da derrubada da floresta, em grande parte causada pelo agronegócio, outros setores da economia brasileira teriam que gastar US$ 2 trilhões em tecnologias – ainda não 100% testadas – de descarbonização.

Este valor é até três vezes maior do que o que seria gasto para conter emissões por meio de preservação ambiental – ou seja, na luta contra as mudanças climáticas nada é mais barato ou eficaz do que parar de desmatar. E o prejuízo seria global: os demais países teriam que rachar US$ 5,2 trilhões para conter o aumento da temperatura média o planeta em até 2°C. Em nome de que estão rifando o nosso futuro?

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Segundo os autores da pesquisa, cientistas das Universidades Federais do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, e da Universidade de Brasília, o troca-troca em Brasília deve resultar na emissão de 1,8 bilhão de toneladas de gases do efeito estufa em 2030 – um número 50% maior do que o prometido no Acordo de Paris. “O retrocesso para uma política do século 19 terá que ser compensado por tecnologias do século 21, ainda caras e pouco disponíveis”, diz Roberto Schaeffer, professor de planejamento energético da Coppe/UFRJ.

O Brasil também joga contra si mesmo quando o assunto é combustíveis fósseis. Enquanto o resto do mundo toma o caminho das energias renováveis – só a China vai investit US$ 360 bilhões no setor até 2020 e desistiu de construir 85 termelétricas a carvão –, o país já gasta cerca de R$ 68 bilhões por ano com subsídios para petrolíferas. Para piorar, ainda tramita na Câmara a Medida Provisória 795, que concede isenções tributárias para a indústria do gás e do petróleo que poderiam ultrapassar R$ 1 trilhão em 25 anos.

O Banco Mundial anunciou em dezembro que até o ao que vem deixará de financiar projetos de exploração e extração de gás e de petróleo. Em janeiro, foi a vez da prefeitura de Nova York comunicar que retiraria US$ 5 bilhões de investimentos em combustíveis fósseis; e na semana passada, foi aprovada na Irlanda uma lei que determina que o país pare de aplicar dinheiro público no setor. A própria Petrobras firmou este mês uma parceria com a empresa francesa Total para investir em energias solar e eólica. Parece até ironia.

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